Velhice, alzheimer e dependência

D. Maria é viúva, tem 89 anos, está quase surda e enxerga com dificuldade. Ela reside em Presidente Prudente, onde sempre viveu, com um dos filhos que também está doente e precisa de cuidados especiais. Para piorar o quadro, D. Maria mede apenas 1,53m, pesa 115 kg e é portadora de Alzheimer. Por ser gorda e pesada está sempre com assaduras, que certamente devem doer e incomodar bastante. Talvez seja este um dos motivos para ela ser tão implicante e rabugenta.
Sendo os dois incapazes de se cuidar sozinhos é necessária a presença constante, dia e noite, de um cuidador. Uma das filhas de D. Maria vive em Brasília e é ela quem se encarrega das despesas com a contratação de enfermeiros e cuidadores e é ela também quem vive correndo entre Brasília e Presidente Prudente para dar assistência e atender as necessidades da mãe e do irmão.
D. Maria não consegue fazer nada sozinha, é totalmente dependente, mesmo que seja para apenas usar o banheiro, pentear os cabelos ou tomar um simples comprimido. É sempre necessária a ajuda de um cuidador.
Diante deste quadro difícil e delicado sua filha precisa contratar cuidadores tanto para o dia, quanto para a noite, pois D. Maria também costuma trocar o dia pela noite.
Como se não bastasse todos os problemas de saúde de D. Maria e seu filho, sua filha enfrenta um outro problema: a rotatividade dos empregados contratados para cuidar de D. Maria. É que os empregados sabem que os primeiros noventa dias de trabalho são considerados como contrato de experiência e, por isto mesmo, eles não têm direito a nenhum tipo de benefício se forem dispensados dentro deste prazo. Sendo assim eles cumprem fielmente o contrato mas, tão logo ultrapassam os noventa dias começam a faltar ao trabalho e também não atendem prontamente às necessidades da idosa, que já chegou a cair em mais de duas oportunidades em que tentou ir sozinha ao banheiro porque os cuidadores não atendiam ao seu chamado.
No ano passado, para piorar as coisas, o enfermeiro que cuidava de D. Maria, um jovem na faixa de uns 30 anos, comprou um dos remédios que ela costuma usar de uma outra marca, e com isto mudou a cor do comprimido. D. Maria questionou com o enfermeiro se ele não estaria lhe dando algum remédio errado, já que ela nunca havia ingerido um comprimido daquela cor. O enfermeiro explicou que era o remédio certo, apenas de um outro laboratório, e mandou que ela abrisse a boca para tomar o remédio. D. Maria abriu a boca, aceitou o comprimido e o copo d'água que ele ofereceu. Em seguida ela inflou as bochechas e cuspiu toda a água e o comprimido no enfermeiro e o chamou de negro mentiroso.
O enfermeiro, na mesma hora, juntou suas coisas e abandonou a casa de D. Maria entre furioso e ofendido. Não satisfeito entrou na justiça requerendo indenização por danos morais no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais). Dias depois a filha de D. Maria foi chamada na justiça de pequenas causas para uma audiência de conciliação.
Ora, convenhamos: tudo bem que exista uma lei que condena qualquer tipo de discriminação, e eu acho que precisa existir mesmo. Mas daí a justiça aceitar que um enfermeiro com pouco mais de 30 anos fique ofendido com uma idosa de quase 90 anos, portadora de alzheimer, que não diz coisa com coisa, e que o xingou de negro mentiroso, vai uma distância muito grande.
Onde é que estamos? Se isto não é uma forma de ganhar dinheiro fácil, o que será? Um enfermeiro precisa estar preparado para enfrentar uma situação como esta. Não é possível que um profissional da área médica não saiba reagir com tranquilidade diante das reações intempestivas de um paciente idoso e com alzheimer.
Indenização no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais) por danos morais porque uma velha de quase 90 anos o xingou de preto? Cá entre nós, não tenha dúvidas de que se ele fosse branco D. Maria certamente o teria xingado de branquelo azedo mentiroso. Ela estava com raiva, e sendo portadora de alzheimer não tinha, como não tem até hoje, controle sobre as emoções ou sobre o que fala. Será que xingar de branquelo também gera algum tipo de indenização?
Estamos vivendo um tempo de verdadeiras cirandas de indenizações geradas por processos movidos por pessoas oportunistas e inescrupulosas, e sentenças duvidosas. Quem for mais esperto ganha mais.
Para quem ficou curioso com o final da história de d. Maria, sua filha acabou fazendo um acordo com o enfermeiro ofendido e mercenário que aceitou receber R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais). Afinal era só dinheiro que ele queria. Ivone preferiu fazer o acordo, pagar e acabar com o assunto de vez. D. Maria continua rabugenta e dando trabalho, e a rotatividade dos cuidadores ainda é muito grande.
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Obrigada pelo comentário. bjs Lou