Adeus

Ontem o câncer levou embora mais uma de minhas amigas. Ela foi apagando devagar e, como uma vela que se consome para encher de luz um ambiente, também ela encheu de luz, carinho, amizade, conforto e muito amor todos aqueles que tiveram a sorte de conviver com ela. Fica uma enorme saudade da Mororó. Como ela gostava de dizer: "adeus amiga", dessa vez, para sempre.
.
Alguns acreditam que a vida não se acaba com a morte. Para ser franca, não tenho certeza de nada, pois não tenho nenhuma teoria formada a respeito desse assunto, mas acredito que a energia da qual somos criados apenas se transforma então, de alguma forma, minha amiga continuará por aí ...
.
Depois de amãnhã irei a São Paulo fazer vários exames e passar por consultas médicas no Hospital do Câncer. Uma amiga costuma dizer que nascemos com prazo de validade. Até concordo, mas prefiro fazer uma boa manutenção para garantir uma extensão desse prazo com boa aliás, excelente qualidade de vida porque para mim a vida só vale realmente a pena quando podemos curti-la da maneira que gostamos.

Curto circuito ou confusão?


A vida é uma sucessão de pequenos morreres?
Pergunta estranha,
Idéia nefasta, mas...
Pensando bem,
Dormir e acordar
É uma forma discreta, e inexorável,
De morrer um pouco a cada dia.
Loucura?
Não vejo assim. Ou será?
Sou estranha.
Estrangeira de lugar nenhum
Ou alienígena?
Sou assim
Paradoxal, às vezes confusa
Cheia de pensares...
Quero ficar, mas também desejo partir
Prá onde ir?
Para muitos lugares e lugar nenhum.

Amizade quase Perigosa

Parecia um sábado como outro qualquer no Rio de Janeiro. A diferença era a ausência do sol e as nuvens baixas e escuras que deixavam o dia triste e a atmosfera pesada. Uma chuva forte se fazia anunciar.
Acordei com preguiça de levantar e fiquei morgando mais um pouco na cama até que a fome me levou para a cozinha onde o café da manhã já estava servido desde muito cedo. O cheiro agradável de tempero enchia o ar aumentando a fome e a vontade de comer. O almoço já estava sendo preparado e a conversa da cozinheira com suas ajudantes enchia o ambiente com um burburinho alegre e cheio de risadas contagiantes.
Assim que terminei meu café com leite acompanhado de um pão quentinho com queijo derretido escorrendo dos lados saí da cozinha correndo e atravessei o jardim que ligava minha casa à clínica que atendia mais de 200 crianças excepcionais (hoje chamadas especiais). Fui direto até a rouparia onde eu sabia que iria encontrar tia Ivete.
Ela estava lá todos os dias separando as roupas recém lavadas e cheirando a desinfetante para colocá-las nas prateleiras enfileiradas ao longo das paredes pintadas de branco. Tia Ivete era uma senhora avançada em idade, muito alta e magra, com uma voz baixa e bem fraquinha. Eu gostava muito de conversar com ela que sempre tinha uma história interessante para contar.
Atenta ao barulho da chuva caindo sem parar observei uma atendente preparando uma criança para entregá-la à mãe. Algumas daquelas crianças tinham a sorte de poder sair nos finais de semana, mas a maioria ficava na clínica todos os dias do ano, durante toda a vida. Suas deficiências eram graves, o que dificultava muito a vida fora dos limites de uma clínica especializada.
Percebi com certa preocupação que o Juarez, um dos internos permanentes, estava muito agitado naquele dia. Gesticulava muito, falava alto consigo mesmo e andava para lá e para cá entre a sala e a rouparia. O médico plantonista estava no consultório que ficava ali perto conferindo alguns prontuários de pacientes que sairiam para o final de semana, enquanto os enfermeiros circulavam despreocupadamente.
Saí da rouparia para a sala de espera e dei de cara com o Juarez que me abordou dizendo com uma voz muito irritada: "você está parecendo minha vó Olga!". No momento seguinte me derrubou em cima do sofá, agarrou meu pescoço com suas mãos fortes tentando me estrangular numa crise de esquisofrenia. Ele gritava muito. Eu já estava quase desmaiando quando o médico e alguns enfermeiros correram em meu socorro. Eram uns quatro homens fortes tentando retirar o Juarez de cima de mim. No momento da crise sua força parecia triplicar.
Os enfermeiros me ofereceram um copo d'água assim que me soltaram das mãos do Juarez. Todo meu corpo tremia. Andei cambeleando até a porta de entrada da sala e senti as gotas geladas da água da chuva molharem meu rosto. Quando me dei conta estava correndo em direção a minha casa e a segurança do meu quarto.
Trancada, ouvi a voz do Juarez chamando meu nome e pedindo que eu abrisse a porta para se desculpar pelo ataque. Ele chorava alto e implorava que eu o perdoasse. Continuei trancada em meu quarto assustada como um coelho fugindo ao ataque de uma ave de rapina.
Juarezinho, como eu o chamava, era uma pessoa querida que vivia na clínica desde muito pequeno. Era esquisofrênico, de vez em quando surtava e ficava muito agressivo. Era impossível viver com a família, pois sua mãe, doente e fraquinha, era alvo constante de suas agressões, o que provocou sua internação desde criança. Na época em que o conheci já contava mais de vinte anos.
Tia Ivete veio até o quarto tentar acalmar-me e insistiu em dizer que o Juarez não iria mais me machucar. Tentou me convencer de que aquele tipo de ataque só acontecia uma vez e apenas com alguém de quem ele gostasse muito, como era meu caso, mas eu estava assustada demais para acreditar naquela explicação que não parecia nada verossímel.
Percebendo que eu estava irredutível e muito assustada ela telefonou para a diretora da clínica explicando o acontecido. Ela foi me pegar para passar o final de semana longe da clínica e do Juarez.
Na segunda-feira seguinte voltei para a clínica "escoltada" pela diretora e pela chefe da equipe médica. Quando o carro parou vi o Juarez junto ao grande portão azul que foi aberto pelo vigia. Meu coração disparou e todos os meus sistemas de alarme ficaram em alerta máximo, mas elas insistiam que eu poderia descer sem medo. Obedeci com as pernas bambas e o coração aos pulos e assim que desci do carro o Juarez veio ao meu encontro, abraçou-me aos prantos, fungando e com o nariz escorrendo de tanto chorar. Aos poucos ele foi se acalmando e eu também.
O carro continuou seu caminho pela alameda que separava o portão da grande casa que ficava ao lado da clínica. Eu subi devagar a pé abraçada com o Juarezinho que falava sem parar e não se cansava de jurar que nunca mais me machucaria.

A melhor parte ficou comigo

Acorda todos os dias com preguiça de levantar
Vira para o lado e diz sonolenta que
Dormirá só mais cinco minutinhos
E volta a adormecer.
O despertador toca novamente
Ela levanta sonolenta e vai tomar uma ducha quentinha
Em segundos está desperta com a melhor cara do mundo.
Toma banho sem pressa,
Chacoalha os cabelos molhados sem pentear,
Espalha creme pelo corpo, borrifa um pouco de perfume
E entra no quarto de vestir.
Escolhe paciente uma roupa elegante
Calça um sapato de salto altíssimo
E em seguida desce para o café da manhã,
Linda, sorridente, segura de si.
Está pronta para mais um dia de trabalho.
Sai com o carro lentamente pelo portão da garagem
E desaparece na curva da esquina.
Entro em casa devagar
E meu pensamento voa longe...
Uma saudade serena invade meu coração.
Você partiu, voltou ao pó,
Mas deixou comigo
A melhor parte da nossa história.

Partida sem chegada

A qualquer hora do dia ou da noite
Ligava falando de saudades
Da falta que sentia de um abraço,
Um carinho, um aconchego.
Fazia muitos planos.
Sonhava e fazia sonhar...
Um dia ligou animado
Estava de passagem marcada e
Chegaria no dia seguinte.
Amanheceu,
Anoiteceu,
Outras manhãs se sucederam
Sem notícias ou
Um telefonema.
Nada. Apenas um silêncio opressor.
Desapareceu no ar
Como fumaça ao vento.

Consulta e exames no Hospital do Câncer em SP

Irei para São Paulo fazer os exames e consultas no AC Camargo no dia 2 de dezembro. É que para fazer os exames será necessário suspender a quimioterapia por 15 dias. Quem sabe os exames revelam bons resultados para que eu possa me livrar de vez dos quimioterápicos? Esperança é a última que morre... Assim diz o velho ditado.
Está hoje na internet o video da agressão sofrida pelos jovens atacados na Av. Paulista. As imagens mostram, sem sombra de dúvida, uma agressão covarde e sem motivo. Quero ver agora o que os pais irão dizer sobre seus filhinhos terem se envolvido numa briga porque foram provocados e também porque levaram uma cantada gay. Os coitadinhos dos delinquentes estavam "chorando" assustados na cadeia que é o lugar onde eles deveriam estar desde que foram presos. A gravação, que é incontestável, mostra que não houve nenhuma provocação por parte dos agredidos, mas apenas um ataque de surpresa dos filhinhos de papai, sem noção de limites.

Agressões

Não tenho dúvidas de que a omissão dos pais e a falta de limites na educação de crianças e jovens são responsáveis pelos inúmeros ataques que vêm acontecendo nos últimos tempos seja na rua, nas escolas, em qualquer outro lugar.
Quando ocorre uma agressão gratuita, como a desses jovens atacados em São Paulo, em plena Av. Paulista por um grupo de cinco outros jovens de classe média, fico chocada com a atitude violenta dos agressores e indignada com a reação dos pais que tentam jusitificar o injustificável e passam a mão na cabeça de filhos mimados e covardes, que atacam em bando.
Não adianta fingir que não aconteceu ou justificar dizendo que os filhos foram provocados e apenas reagiram. Reagiram em bando e naquela proporção? Havia outras pessoas por perto que testemunharam o ataque cruel e covarde. Pensem um pouco: por que será que seus filhos carregavam lâmpadas flourescentes grandes nas mãos? Com certeza não estavam a procura de uma lixeira para descartar corretamente o lixo que carregavam, às 6 horas da manhã.
Infelizmente, educação, limite, respeito, cortesia parecem fazer parte de um passado remoto. Hoje o jovem, acobertado até mesmo por seus pais, acredita poder tudo. Agride professores nas escolas, mendigos na rua, colegas dentro das salas de aula. Onde será que vamos parar?
Semana passada um estudante de enfermagem agrediu e quebrou os dois braços e seis dentes da Coordenadora da escola em que estudava simplesmente por ter sido reprovado em uma matéria. Não podemos aceitar um absurdo desses sob nenhuma hipótese. No tempo em que estudei, nota baixa se resolvia com uma bela bronca dos pais, às vezes um castigo e maior empenho nos estudos. Simples assim. Ah, e existia reprovação. E cá entre nós, o que se pode esperar de um profissional da área de saúde, que ainda estudante, agride alguém assim? Ele vai acabar matando um paciente difícil. Ou estou errada?
O fato é que precisamos resgatar valores que ajudem a construir uma sociedade mais equlibrada e justa. Precisamos orientar melhor nossos filhos incutindo neles valores morais e éticos. Precisamos de uma educação de qualidade que leve o jovem a ter um pensamento crítico e também para colocar nos trilhos uma sociedade embriagada pelo ópio que sustenta o poder e a corrupção.
Falando em educação, alguém já ouviu falar que estão predentendo abolir Monteito Lobato das escolas sob a alegação de que ele usa termos racistas? Hipocrisia das piores. A literatura de Lobato precisa ser colocada no tempo em que foi escrita e não no contexto atual. Pensamento racista está é na cabeça de uma pessoa que propõe um absurdo desse tamanho.
A mudança precisa acontecer urgente, pois infelizmente o que temos visto são exemplos nefastos vindos de pessoas que deveriam servir de modelo ao jovem. A começar pelo Presidente da nação violando regras para alcançar seus objetivos a qualquer custo e insinuando que estudar não é importante, ou membros da mais alta corte de justiça chamando seus pares para uma briga de braço, ou parlamentares saindo no tapa em Plenário como se fosse um ringue de luta livre e não um local de trabalho que deveria ser usado apenas para se discutir leis objetivando o desenvolvimento de uma nação complexa e de dimensões continentais como o Brasil.
Em resumo, penso que uma profunda mudança estrutural precisa ser colocada em prática para erradicar esse cancro que corrói nossa sociedade em seus valores éticos e morais. Penso também que a intolerância e o preconceito precisam ser erradicados, pois qualquer pessoa branca ou negra, rica ou pobre, culta ou ignorante, nacional ou estrangeira, religiosa ou atéia não tem o direito de atacar outra alegando não concordar com sua escolha sexual, sua origem, seu modo de vida, suas preferências ou seja lá o que for.

Ontem tive um dia difícil, cheio de efeitos colaterais do tykerb combinado com o xeloda. Tentei fazer um programa com uma amiga, mas foi impossível, coisas do tratamento. Paciência.
Fiquei feliz com o recadinho da Jornalisa. Quero agradecer a todos que se dão ao trabalho de ler meus textos. Gosto de escrever e saber que alguém aprecia meus escritos é um grande prazer. Obrigada.

Correndo na praia de calcinha rendada

Ela é sex
Sexagenária.
Baixinha,
Pernas curtas e roliças,
Mas ágil como uma gazela.
Fala rápido
E caminha mais rápido ainda
Deixando para traz qualquer um fora de forma.
Um dia desses, com um grupo de amigos também sex
Desembarcou em praia paradisíaca,
Bem distante da cidade.
Tão logo colocou seus pés na areia
Apressada, despejou sua bagagem num banco tosco de madeira
Arrancou toda a roupa num piscar de olhos
E saiu correndo em direção ao mar.
Um grito a fez parar de sobressalto
Era sua irmã alertando que na pressa
Ela se esquecera de trocar a calcinha rendada (e transparente)
Pelo maiô comportado.
Retornou rápido como um corisco
E sentou-se no primeiro banco que viu
Puxando uma amiga para sentar sobre suas pernas
Bronzeadas pelo sol forte da Paraíba.
Vestiu novamente a bermuda
E foi correndo se trocar no banheiro rústico
Enquanto o grupo explodia numa sonora gargalhada
Pela cena inusitada:
Uma baixinha sex correndo na praia de calcinha rendada.

Reforçando o sistema imunológico




Interrompi o uso do xeloda por duas semanas (o certo é apenas uma) para poder viajar com amigas. Posso garantir que o efeito terapeutico da viagem é infinitamente melhor do que o quimioterápico, pois adoro viajar e sentir a vida em sua plenitude, adoro caminhar sem destino, dar risada, ouvir piada idiota, tomar suco quando todo mundo está tomando cerveja e achar que mesmo assim a vida vale a pena. Nesses momentos sinto a vida fluir leve e nunca penso em doença ou tratamento. Câncer? O que é isso mesmo???

Pois é, confesso que viajar para sair da rotina é para mim o melhor elixir de boa saúde. Dessa vez fui conhecer João Pessoa e confesso que me surpreendi com a cidade e a beleza de suas praias de águas mornas e limpas. Num dia meio nublado foi impossível resistir a um bom mergulho. Deixei meu corpo ser levado ao sabor das ondas e só saí da água para fugir do sol que resolveu dar as caras com todo seu calor. Aliás, o sol nasce em João Pessoa a partir das 5:00 h da manhã e se esconde bem cedo, lá pelas 17:30h.

Sempre fujo do calor, primeiro porque não gosto de ficar lagarteando ao sol e também porque a medicação que estou tomando escurece a pele e tomar sol provoca manchas escuras principalmente no rosto. Mesmo tomando cuidado e usando muito protetor solar estou com o rosto todo cheio de pintas escuras. Ninguém merece um rosto manchado.

O saldo da viagem foi ótimo e valeu muito mais do que qualquer quimioterapia. Aliás, estar entre amigos é sempre bom demais e reforça qualquer sistema imunológico. Também adoro viajar com minha filhota. Formamos uma dupla perfeita, pois gostamos das mesmas coisas e viajar é nossa melhor diversão.