Um giro em Paris (10 out 2017)

     Saímos depois do café da manhã e fomos caminhando sem pressa até a Uniqlo. Queríamos comprar algumas blusas bem quentinhas para enfrentarmos o frio da Bretanha. 
     Não foi uma caminhada fácil para mim porque eu não estava me sentindo muito bem. Do nada eu começava a suar frio e enjoava. Acho que era efeito colateral da última quimioterapia. Toda hora eu precisava parar perto de alguma lixeira para vomitar e, do mesmo jeito que o mal estar vinha ele desaparecia como que por encanto.
     Compramos alguns agasalhos quentinhos e depois paramos para almoçar. Tive que encarar apenas uma sopa de legumes, que por sinal estava uma delícia, porque o mal estar não me deixava com coragem para comer nada além de uma sopinha.
     Batemos perna sem pressa de chegar a lugar algum, olhamos vitrines, sentamos nas praças para apreciar o movimento e descansar um pouco. Ficamos apenas vendo a vida passar, as árvores perdendo suas folhas para o outono, as calçadas cobertas de folhas amarelas. Gosto de sentar e ficar observando aquele monte de gente apressada correndo de um lado para o outro, turistas fotografando tudo, ruas lotadas, tráfego caótico, buzinas rasgando o ar... Fico tentando imaginar o que se passa na cabeça das pessoas... Um monte de pessoas anônimas dividindo o mesmo espaço na cidade luz...
      Ao entardecer fomos para a beira do Sena apreciar o por de sol. Pegamos um belo dia de céu azul e temperatura agradável, ideal para bater perna e andar sem destino pela linda Paris, e ideal para ser encerrado com um fantástico por de sol.
     Quando o cansaço tomou conta do grupo pegamos um táxi de volta ao hotel. A noite, quando a fome reclamou, fomos a um restaurante próximo para tomar uma deliciosa sopa de cebola. Adoro a sopa de cebola gratinada servida na cidade. É boa demais.

Chegada em Paris (9 out 2017)

     A viagem foi um pouco cansativa por causa das muitas horas de voo. Saímos de Brasília para Lisboa no dia 8 de outubro, e de lá fizemos conexão para Paris. Chegamos muito cansadas, afinal não somos mais crianças e o tempo cobra um tributo alto...
     Fizemos nosso check in com a Raquel, uma jovem muito atenciosa e gentil, e saímos para almoçar. Nosso hotel ficava próximo da Rue Rivoli, cheia de lojinhas e restaurantes. Depois do almoço caminhamos um pouco pela margem do Sena, atravessamos a Pont Neuf, que está cheia de cadeados que os turistas penduram (uma prática que tem causado muitos problemas), e fomos até a Igreja de Notre Dame. 
     No caminho até a igreja vimos alguns mendigos com seus animais de estimação, esmolando nas calçadas e pontes, e guardando cuidadosamente uma moeda e outra que alguns transeuntes colocavam em seus chapéus. Observei o carinho com que aqueles mendigos cuidavam de seus bichinhos. Um senhor barbudo abraçava carinhosamente seu cachorro que recostava a cabeça em seu peito com a melhor cara dengosa do mundo. Outro senhor tinha três cachorros, dois no colo e um enrolado num cobertor que parecia bem quentinho. Na Pont Saint Michel, uma idosa estava sentada com dois coelhos que comiam algumas folhas de alface bem verdinhas. Já vi muitos mendigos com cachorros, mas com coelhos de estimação foi a primeira vez. Os mendigos sempre cobram uma moeda dos turistas que querem tirar suas fotos. Colaboramos com uma moeda também.
      Fiquei sabendo que a prefeitura não recolhe os mendigos com animais de estimação porque são obrigados a colocar os animais albergados também. Como fica muito caro albergar animais os fiscais da prefeitura fazem vista grossa para a prática e os mendigos continuam pelas ruas da cidade esmolando e contando com a empatia das pessoas por seus animais...
     Na igreja de Notre Dame ficamos sentadas na praça algum tempo observando o vai e vem dos turistas fotografando a catedral de todos os ângulos e fazendo selfies, enquanto ouvíamos o burburinho incessante da cidade. Como estávamos muito cansadas da viagem fomos voltando devagar para o hotel. Dormimos pesadamente naquela noite, auxiliadas pelo silêncio que reinava no hotel, apesar da proximidade com as ruas movimentadas.

Revendo minha filha

      Minhas férias da quimioterapia chegaram ao fim. Que pena.
     Cheguei de viagem ontem e desci do avião enjoando. Acho que comi alguma coisa que não me caiu bem... Vomitei muito, mas tomei um chá de boldo feito pela minha mãe e hoje amanheci nova.
      O início da viagem foi um pouco difícil. Do nada eu começava a suar frio e enjoava muito e, do mesmo jeito que o enjoo vinha ele desaparecia como se nada tivesse acontecido. Apareceram alguns sintomas novos que desapareceram aos poucos. Ainda bem, pois cheguei a ficar preocupada porque eram três semanas de férias antes de retornar a Brasília. Tive dois episódios de diarréia na primeira semana, vomitei bastante, mas depois fiquei bem e pude curtir muito minha viagem pela Bretanha. O melhor de tudo foi rever minha filha e viajar com ela por lugares que eu gosto tanto.
     Nosso reencontro foi no hotel em Paris. Ela havia me avisado que só chegaria por volta das 15h então, eu e minhas amigas, saímos para passear na beira do Sena pela manhã, sem pressa, observando a paisagem, o vai e vem das pessoas, o burburinho daquela cidade encantadora. Quando voltamos ao hotel, antes do almoço, a recepcionista me avisou que ela já havia chegado mas que tinha saído para almoçar. Subimos para o quarto e quando estávamos saindo, no corredor, dei de cara com minha filha vindo ao meu encontro com o melhor sorriso do mundo estampado no rosto.
     Foi como se o tempo parasse... Fiquei provavelmente com cara de boba. Como em câmera lenta nos aproximamos uma da outra e nos abraçamos apertadas para diminuir a saudade, como que para ter certeza de que estávamos novamente juntas, uma sentindo a outra, cheirando a outra... Me vi chorando de emoção. Um amor imenso inundando meu coração. Foi bom demais aquele reencontro, aquele abraço, aquele sentimento explodindo em risos, lágrimas, toques sutis...
     Não sei dizer quanto tempo ficamos ali abraçadas. Alguns minutos decerto, mas valeram como uma eternidade. Quando as emoções serenaram nos demos as mãos e saímos todos juntos para o restaurante. Ela e o marido já tinham almoçado mas eu e minhas amigas estávamos famintas. 
     Depois do almoço voltamos para o hotel, descansamos um pouco e saímos passeando juntos. Mais tarde eu e minhas amigas voltamos para descansar enquanto eles continuaram curtir a cidade. Nada como a energia e animação da juventude. A idade cobra seu tributo e é melhor não exagerar. Dormimos cedo, pois no dia seguinte iríamos seguir viagem de carro para a Bretanha e, no caminho, estava planejado pararmos em Chartres, para conhecer a famosa catedral gótica da idade média.

Preparando para minhas férias de quimioterapia

     Quarta-feira a noite senti minha garganta arranhar e não deu outra, gripei. Também, com esse tempo maluco que ora está quente, quase cozinhando a gente e, de repente, faz um frio danado, não há corpo que resista sem ao menos pegar um resfriado. Agora, além de falar baixinho ainda estou rouca.
      Ainda bem que o dia da minha viagem de férias está chegando. Estou muito animada. 
      Na quarta-feira tive consulta com o Dr. Igor, já que minha oncologista, a Dra. Daniele, está de licença gestante. Sua filhinha estava um pouco apressada e acabou chegando antes do esperado. 
      O Dr. Igor ficará atendendo os pacientes da Dra. Daniele durante sua licença. Gostei muito dele. É um médico com uma cara muito boa e me pareceu muito atencioso. Aliás, a bem da verdade, toda a equipe do Hospital Sirio-Libanês é muito boa, não dá para negar.
      Conversei com o Dr. Igor sobre a proposta  da Dra. Dani para que eu fizesse o teste genético da Foundation One para saber se existe alguma droga que consiga barrar o avanço do câncer que, no meu caso, saiu do controle porque já fiz todos os protocolos disponíveis para casos como o meu. Falei com ele que pensei muito sobre o assunto e decidi que não farei o teste. Não quero criar falsas expectativas para depois ficar frustrada porque não há nada que realmente possa ser feito. Prefiro deixar como está e ir vivendo um dia de cada vez e sendo feliz com o que tenho em minhas mãos agora, como minha próxima viagem por exemplo.
     Ele apoiou minha decisão. Além do mais, como eu sempre disse e acredito, temos prazo de validade. Quando chega nossa hora de partir não adianta espernear porque vamos morrer mesmo então... nesse intervalo entre o nascer e o morrer quero mais é ser feliz agora.
      Ontem fiz apenas o herceptin, para que eu possa viajar e aproveitar minhas férias. Quero aproveitar minha viagem para a Bretanha e curtir aquela natureza selvagem, indomável. Quero ver de perto, mais uma vez, aquelas incríveis marés que sobem mais de 15 metros em poucos minutos. Quero caminhar pelas florestas, observar as belíssimas hortências que crescem em todos os lugares enchendo o mundo de flores coloridas. Minha conexão com Deus fica muito mais forte quando estou em contato com a natureza e é isso que vou encontrar na Bretanha. Lá também posso encontrar o encanto da Floresta de Brocéliande e a magia de Merlin... 
      Estou contando os dias, principalmente porque vou encontrar minha filha em Paris e de lá viajaremos juntas para a Bretanha. Será muito legal! Vamos ficar juntas uma semana e então ela seguirá viagem enquanto eu permaneço mais alguns dias em Dinard, antes de voltar para Brasília.
      Na volta para Brasília terei que fazer o PET mais uma vez para avaliar a eficácia do folfiri. Quem sabe as notícias desta serão melhores do que no último PET; afinal tem a mágica do Merlin que vou encontrar em Brocéliande e o milagre do Pai, nosso criador.