Enfrentando filas


Ontem amanheceu nevando, estva tudo branquinho lá fora. É bonito de se ver, mas dá vontade é de ficar quietinha em casa, protegida do frio e do vento. As aventuras lá fora podem muito bem esperar...

Eu avisei, mas ela não quis acreditar. De longe dava para ver a enorme fila para entrar no MOMA. Resolvemos comprar o city pass para ganhar tempo, mas mesmo assim levamos pelo menos uma hora na fila.

Nunca fui uma apreciadora de arte moderna ou contemporânea e quanto mais conheço esse tipo de obra em grandes museus menos aprecio. Não consigo entender, definitivamente, como um museu coloca em exposição obras tão sem sentido porque, cá entre nós, um quadro todo pintado de preto ou um arame dobrado e cheio de botões coloridos, ou ainda um punhado de açucar sobre uma superfície preta não dá para ser considerado arte, mas estava lá exposto. Quem conseguir, por favor, tente me convencer do contrário.

Numa das salas havia vários objetos que pareciam absolutamente sem sentido, como uma xícara toda coberta de pelo e com uma pena colada no fundo. Qual o objetivo de uma coisa dessas?

Mas o Moma abriga quadros do Monet, que ocupam uma sala inteira, do Van Gogh e alguns Cezanne. A noite estrelada de Van Gogh está lá. Apreciar de perto essas obras faz valer a visita.

Saímos do Moma e resolvemos seguir para o Empire State. Que roubada! A visão lá de cima é fantástica, ainda mais quando a cidade já está toda iluminada, mas enfrentar uma fila de pelo menos duas horas para isso não vale a pena. Definitivamente essa época do ano é muito chata em qualquer lugar do mundo, especialmente em Nova York, pois tudo está muito cheio e é preciso enfrentar fila para qualquer coisa que se queira fazer, além de aguentar o mau humor de quem está trabalhando.

Teatro e frio em Nova York


Como adoro a magia do teatro, visitando Nova York aproveito a oportunidade para assistir grandes peças teatrais. É sempre um sonho.

Ontem fui assistir as Rockettes no Radio City, que só acontece nessa época do ano. Já assisti essa peça há uns dez anos e posso garantir que está muito melhor agora. Aproveitando o avanço da tecnologia, inovaram acrescentando o recurso de 3D num dos quadros. Ficou muito interessante.

O espetáculo das Rockettes impressiona por vários motivos: um deles é que todas as moças que atuam na peça são exatamente do mesmo tamanho, o que dá um efeito muito interessante no palco; outro, elas atuam em perfeita sincronia. A Bárbara ficou impressionadíssima e naturalmente encantada.

Hoje o dia amanheceu gelado. O céu estava azul de brigadeiro, mas a temperatura era de menos 9 e com sensação térmica de menos 22 graus, por causa do vento intenso. Pense numa coisa horrorosa como essa. Estava de doer. O vento penetrava pelas roupas grossas e gelava as mãos, pés, orelhas e cabeça, por mais cobertas que estivessem. Dava a impressão que os dedos iriam congelar e cair. Chegou uma hora que não dei mais conta de andar e preferi voltar correndo para o quentinho de casa e não saí mais.

Pela manhã resolvemos conhecer o Museu de cera da Madame Tusseaud e foi uma decepção. A impressão que tivemos é que por ser atração turística certa os organizadores não se preocuparam em fazer um museu da mesma qualidade do que existe em Londres, pois bom ou ruim sempre haverá fila para conhecer a atração. Outra coisa ruim é o acesso para saída do museu. Qualquer pessoa com dificuldade de locomoção terá dificuldade em vencer tantos lances de escada para chegar até a rua.

No final da visita o museu apresenta um filme em 4D. É interessante porque além do expectador ter a impressão de estar dentro do filme ele também consegue sentir algumas sensações que aparecem na cena, como na hara que o trem derrapa e a neve espirra no rosto das pessoas.

Também fomos conhecer a Grand Central Station. A Bárbara estava curiosa para conhecer a pintura das constelações no teto da estação. Ficou um pouco desapontada com o que viu e concluiu que a propaganda é realmente a alma do negócio pois, além dos passageiros a central estava lotada de turistas fotografando tudo.

Além da pintura no teto, das belas colunas e estátuas de deuses, das várias lojas e restaurantes, demos de cara com vários policiais espalhados pelo local e armados até os dentes. A impressão que tivemos é que estavam em alerta, o que nos deixou com vontade de sair dali o mais depressa possível, mas como estávamos famintas, acabamos jantando por lá antes de voltarmos para casa.

Aterrisando em Nova York

Pensei que iríamos aguardar muito tempo em São Paulo, mas como as filas para qualquer coisa que fosse estavam gigantescas acabou sendo o tempo quase que ideal para evitar correrias e stress.
Falando em stress, o primeiro aconteceu ainda em Brasília. Nosso portão de embarque era na ala internacional, como estava acontecendo um embarque "internacional", como era de se esperar, não pudemos entrar porque nosso vôo era doméstico até São Paulo. Não havia nenhum funcionário da Gol que pudesse informar onde realmente aconteceria nosso embarque e o painel não informava nada. Uma desorganização. Havia pessoas idosas na mesma situação e eles estavam muito aflitos. Quando finalmente sentamos no ônibus que nos levaria até o avião pudemos observar os retardatários com caras aflitas, que chegavam esbaforidos como nós havíamos chegado minutos antes.
Desembarcamos em Congonhas e pegamos o ônibus da Gol até Guarulhos, a viagem ocorreu sem incidentes. Assim que desembarcamos fomos direto fazer o check in e encontramos uma fila quilométrica mais de cinco horas antes do vôo internacional. A fila para entrar no portão de embarque parecia um pesadelo: dava mais de quatro voltas e demorou muito tempo até conseguirmos entrar. A Bárbara, com fome, resolveu fazer um lanche, pelo que pagou os tubos por uma coisinha de nada. Ela ficou ainda mais revoltada quando chegamos na sala Vip da Delta e encontramos, graciosamente, todo tipo de comida e bebida a nossa disposição.
A viagem até Nova York foi muito tranquila e a cidade parecia nos aguardar de braços abertos. O céu era de um azul intenso e o sol brilhava como se fosse primavera. Em pouco tempo deixamos o aeroporto e chegamos ao nosso destino em Manhattan. A Alba tambem nos aguardava de braços abertos.
Deixamos nossa bagagem, fizemos um lanche e saímos. A temperatura estava agradável, o que permitia caminhar confortavelmente pela ruas da cidade. A Bárbara, aproveitando seu atual espírito consumista, fez algumas compras indispensáveis (isso na opinião dela) o que nos obrigou a retornar para casa e deixar os pacotes. Em seguida tornamos a sair, dessa vez para passearmos pelo Central Park.
Como todo turista que se preze começamos nosso passeio numa charrete decorada com gosto duvidoso (com flores artificiais em volta dos bancos), mas puxada por um belo cavalo branco e dirigida por um cavaleiro jovem, bonito e simpático, que saiu do interior da Turquia há uns quatro anos. Enquanto o cavalo trotava vagarosamente por um percurso que lhe é tão familiar, o cavaleiro ia mostrando os prédios que guardam alguma história, como aquele onde John Lenon morou.
Terminado o passeio continuamos a pé e tiramos várias fotografias antes de escurecer por volta das 5 horas. Um pouco mais tarde começamos a voltar bem devagar para casa apreciando a decoração do natal. As árvores estão iluminadas com luzes brancas, parecendo cristais translúcidos.
Cheguei em casa muito cansada (a idade é um fato que não dá para ignorar). Eu não via a hora de tomar um bom banho e cair numa cama quentinha e macia.

Pausa para Viajar

Finalmente chegou, hoje é véspera do Natal, antevéspera de minha viagem de férias com a Bárbara. Vamos ficar fora duas semanas e quero aproveitar cada minuto, pois são as memórias desses momentos de alegria, de pura expectativa, tudo o que realmente nos pertence...
Ontem pela manhã eu estava cabisbaixa enquanto fazia quimio. Estava introspectiva pensando em todas as coisas que vi e senti nos últimos dias com a morte de minha querida amiga. Foi inevitável refletir sobre o sentido da vida, sobre a transitoriedade de tudo que nos cerca.
Mas a roda da vida não pode parar e não adianta ficar chorando, se sentindo infeliz. As horas continuam passando indiferentes ao seu estado de espírito; o dia continua amanhecendo e a noite cobrindo tudo de negro. Às vezes a chuva cai podendo até causar destruição, mas uma hora o sol volta a brilhar. O curso do tempo é imutável.
É por isso que hoje acordei animada e começando a curtir a viagem de férias que para mim teve início no momento em que comecei a separar as roupas que colocarei na mala. Peguei os cachecóis, as luvas e gorros, os casacos quentinhos, as meias de lã, pois vamos enfrentar um frio danado. A Bárbara não vê a hora de desembarcar em Nova York e desbravar aquela grande metrópole. Ela está toda animada.
Essa é a forma que encontrei para renascer das cinzas e exorcizar tudo que não está legal: largo tudo para trás e faço uma pausa para viajar.

Invasão de Privacidade

Precisei entrar em seu quarto, abrir seus armários, mexer em suas coisas. Tirei tudo do lugar, conferi todos os papéis e documentos, separei suas roupas, os presentes nas embalagens, os perfumes ainda embrulhados. Esvaziei suas bolsas pesadas, cheias de objetos usados em seu trabalho de médica neurologista. Mexi em tudo e me senti violando sua intimidade, expondo seus segredos...
Confesso que foi desconfortável, não tive prazer no que fiz, mas foi preciso, não havia como adiar aquela tarefa.
Em seguida fui para o escritório. Seus livros de estudo, quietos nas prateleiras, estão se enchendo de poeira. Por hora eles não podem cumprir seu papel. Dois vestidos que você usava ainda estavam pendurados num cabide apoiado numa estante. Na escrivaninha precisei abrir as gavetas e remexer em tudo procurando documentos que ninguém tinha certeza se realmente existiam. Não encontrei nada relevante, apenas alguns antigos cartões de natal guardados numa caixa e que descartei como um lixo qualquer. Que sensação horrível. O que lhe era caro foi jogado fora como coisa sem valor. Encontrei um monte de blocos de receituário controlado que precisei destruir, pois não serão mais usados por você ou qualquer outro médico. Suas anotações de estudos médicos também foram parar no lixo e não consegui deixar de pensar o quanto de conhecimento acabou desaparecendo com você.
Na mesinha de cabeceira encontrei uma palavra cruzada já começada. Reconheci sua letra, mesmo escrita com uma mão trêmula e vacilante, que não possuía mais a firmeza de tempos passados. Essa resolvi guardar comigo, pois sabia que ninguém iria se interessar por um bloco de palavras cruzadas.
Terminada a tarefa fiquei ali parada, olhando para tudo aquilo que fora seu. Uma emoção estranha tomou conta de mim. Todas as coisas que lhe foram tão úteis, que lhe deram prazer, que lhe eram caras estavam ali separadas e parecendo tão sem sentido... Suas roupas, suas bolsas, seus cintos e sapatos serão doados para caridade. Seus livros, na melhor hipótese, irão parar em um sebo. Suas coisas pessoais, suas cartas e anotações saíram de cena como você.
Quando a noite chegou, já cansada acabei dormindo em sua cama. Eu tinha a sensação de que você poderia chegar a qualquer momento pisando firme e fazendo barulho com o salto do sapato. Sua voz parecia ecoar no fundo da minha memória e era difícil acreditar que nada disso poderia acontecer jamais porque você partiu para sempre pegando todos de surpresa. Partiu sem dizer adeus.

A neurologista que virou borboleta

Ninguém gosta de despedidas, ainda mais quando sabemos que não haverá volta. Aí, perdemos o chão.
Ela criou asas e voou para o céu, voou para junto do Senhor. Partiu sem dizer adeus deixando um enorme vazio em muitos corações. Ficou apenas o gosto amargo da saudade...
Deixou o corpo maltratado pela enfermidade, como uma borboleta deixa seu casulo. Agora finalmente está livre de todas as dores, de todos os medos e preocupações. Sua alma liberta flutua livre pelo espaço.
Foram setenta e sete anos, dos quais mais de cinqüenta dedicados a prática da medicina. Profissional incansável, não havia distância ou hora imprópria para o atendimento. Estava sempre pronta a aliviar o sofrimento das pessoas. Neurologia era sua especialidade. Era um desses raros profissionais que sabe escutar o paciente.
Trabalhou até o fim e só parou quando ela própria ficou doente e precisou ser internada. Foi apagando devagar como uma vela que é consumida pela chama.
Não houve oração capaz de segurá-la mais tempo, pois era chegada sua hora de se transformar numa outra forma de energia e como uma borboleta ela rompeu seu casulo e voou para bem alto, para juntinho de Deus.
16/dez/2009

Significado do Natal

Hoje é aniversário do Padre Pedro Bach. Que data especial! Acabei de chegar da missa que ele mesmo celebrou para comemorar a data. O coral das crianças de uma creche em São Sebastião, muito bem ensaiado por sinal, cantou lindas músicas durante a missa.
O Pe. Pedro é uma criatura muito especial para mim e muitas outras pessoas que o conhecem. Ele completou hoje 74 anos de vida dos quais mais de 50 foram dedicados ao sacerdócio, que ele vive intensamente.
É impressionante ver a força espiritual dele. O Pe. Pedro, mesmo enfrentando sérios problemas de saúde, é incansável em seu ministério. Todos os meses, na 2ª segunda-feira, ele está em Brasília celebrando missa e atendendo todas as pessoas que vão falar com ele em confissão ou apenas para conforto espiritual. Ele vive em São Paulo, mas está sempre circulando por várias cidades celebrando missas e atendendo a todos que o procuram. Ele também coordena uma instituição que cuida de crianças carentes e abandonadas. Já passaram por seu instituto mais de 2000 crianças.
Na missa de ontem ele falou sobre o significado do Natal. Hoje ele tornou a dizer que o Natal não é apenas festa, troca de presentes ou comer panetone. Natal é abrir o coração para deixar o outro entrar. Natal é perdoar, mesmo que não se consiga esquecer. Em resumo, Natal é amor.
E o que é o Amor?
Com certeza não é troca de beijos e abraços apaixonados. Isso é apenas paixão e paixão não dura muito tempo. Também não é um relacionamento cheio de ciúmes e desconfianças, pois isso é doença. E o que é amor?
Terminada a missa os organizadores da festa de aniversário do Pe. Pedro passaram um vídeo mostrando um trabalho de distribuição de refeições no lixão, realizado pela Escola DAC . Fiquei impressionada. Quanto gente vivendo de catar lixo. Que realidade cruel. Na capital da República, onde parlamentares rezam após a distribuição de polpudas somas de dinheiro vindo da corrupção, centenas de pessoas vivem das nossas sobras que foram jogadas no lixo.
Jesus é amor. Foi uma mensagem de amor que Ele trouxe ao mundo ao nascer e morrer por nós.
Vamos pensar no verdadeiro significado do amor neste Natal. Vamos refletir um pouco...

Você sabe avaliar a dor do outro?

Dor é coisa complicada, que deprime e angustia. Acho que ninguém consegue lidar bem com ela. Algumas pessoas até se tornam dependentes de remédios para alcançar alívio para suas dores físicas ou emocionais. Já faz algum tempo que escrevi esse texto, mais de dois anos, quando as dores fortes eram companheiras quase que diárias.
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Qual a dor mais doída? Cada um, na sua experiência individual, dará uma resposta diferente. Alguns dirão que é a dor de dente, a dor do parto, a dor que se sente ao tentar expelir uma minúscula pedrinha pela uretra. São várias as dores e diferentes suas intensidades.
O que vale de fato é a dor atual, seja ela física, emocional ou moral. Vocês já pararam para observar como dói um coração partido? É quase uma dor física. Dói lá na alma ver partindo a pessoa que amamos, ver os filhos alçando vôo e saindo debaixo de nossas asas protetoras para ganhar o mundo; dói ver o namorado, o marido, o amante saindo de nossas vidas; qualquer um que nos é caro faz doer o coração na hora da partida...
Alguém se lembra daquela topada no dedão do pé? Ai, como dói. Arrancou a tampa do dedão, sangrou pra caramba e até impediu o uso de sapato fechado por um tempão. Qual da criança ou adulto já não passou por uma experiência dessas?
Uma tentativa desastrosa fez um corte profundo no dedo. Ai que horror, parece que todo o sangue do corpo vai escapar por aquele corte. As lágrimas rolam sem cessar. O choro faz o corpo sacudir por inteiro. E aquele cortinho ridículo com folha de papel? Quer alguma coisa mais minúscula e que arde mais? Às vezes nem enxergamos o corte, mas sentimos à beça o seu ardido.
Pois é, dor é uma experiência individual. Não dá para dizer que sua dor é maior ou menor do que a do outro. E o pior é que a dor é invisível. Ninguém vê a dor. Só quem está sofrendo é que a sente. Fraca ou forte, súbita ou ameaçadora, ela é absolutamente invisível.
Sempre tive medo da dor física e ela tem sido, nos últimos tempos, uma desagradável e constante companheira. Às vezes ela dá um sinal e escapa como um ladrão furtivo deixando-me apreensiva. Outras vezes ela se instala sorrateira e acha que é a dona do pedaço. Quando ela surta vem louca como uma locomotiva desgovernada e aí, sai de baixo, ela me joga no chão como um trapo velho... Ela grita alto que é ela quem está no comando. Será verdade? Tenho certeza que não, mas é necessário um tremendo autocontrole para não perder a sanidade, porque a dor desorienta e deprime...
Há pouco tempo, quando uma dor desembestada tomou conta do meu corpo e me levou para a UTI pude refletir um pouco. Enquanto meus gritos e ais cortavam o espaço, vários médicos, enfermeiros e atendentes tentavam ajudar-me ministrando potentes drogas que aos poucos fizeram meu corpo entorpecer e a dor foi cedendo. Depois de um sono reparador, já desperta, pude observar outras pessoas à minha volta e outros gemidos. Agradeci silenciosamente a Deus pelo convênio médico que me ampara com um atendimento tão eficiente. Agradeci a toda equipe médica que não poupou esforços para tentar resolver meu problema e me senti afortunada. Agradeci todos aqueles cientistas que no isolamento de um laboratório conseguiram desenvolver drogas tão eficientes. Que Deus os abençoe.
Tenho que reconhecer que embora esteja atravessando um pântano escorregadio e escuro consigo vislumbrar raios de luz que me orientam para a saída. Sei que essas luzes vêm das orações dos amigos e da família, do amor de cada um deles. Só posso ser uma criatura abençoada e muito amada. Ele me dá a prova, mas permite o auxílio de tantas pessoas especiais ao longo do percurso. Sei que depois da curva escura existe uma saída repleta de sol e estou caminhando naquela direção. Sei que poderei tropeçar algumas vezes e até mesmo cair, mas tenho certeza de que serei capaz de levantar tantas vezes quantas forem necessárias. O amor e a amizade são remédios eficazes, que curam toda e qualquer enfermidade, toda e qualquer dor.
Mas seja lá como for dor é dor e pronto. E aí, qual a dor mais doída?

Falso Sequestro

Não dormi bem essa noite e amanheci o dia cansada. A Bárbara saiu para o trabalho e eu estava de saída para minha consulta médica quando o telefone tocou. Voltei do portão e atendi a ligação, era a voz de uma mulher chorando desesperada ao telefone. Quando questionei o que estava acontecendo a pessoa ainda chorando disse-me: "é sua filha". Pensei se tratar de um acidente envolvendo minha filha que acabara de sair para o trabalho. Como a pessoa chorava muito não consegui entender o que ela falava e passei o telefone para minha irmã. Nesse momento um homem pegou o telefone e disse que minha filha fora sequestrada, estava sob a mira do seu revólver e que eu teria que depositar a quantia de R$ 15.000,00 ou ele a mataria.
Foi um momento de muita tensão. Tentei falar com a Bárbara no celular, mas ela não atendeu. Em seguida liguei para uma amiga que tentou me acalmar dizendo que não fizesse nada e que a ligação era um golpe. Eu estava muito nervosa.
Enquanto minha irmã tentava negociar com o bandido no telefone fixo minha filha acabou ligando no celular dizendo que estava em segurança, trabalhando no escritório. Foi um alívio. Minha irmã, quando se deu conta do golpe, xingou muito o bandido do outro lado da linha e desligou o telefone.
Passado o susto fui conferir no bina o número do telefone do bandido. Era um celular do Rio de Janeiro, certamente furtado.
Estávamos no banco quando o celular, exibindo uma ligação sem identificação, tocou às 12:15h. Era o bandido novamente tentando extorquir algum dinheiro dizendo ter sequestrado minha filha. Para intimidar ele coloca uma pessoa chorando ao telefone enquanto informa que irá atirar na cabeça da vítima se não for atendido. Como eu sabia que minha filha estava em segurança no escritório falei para o bandido que poderia fazer o que bem entendesse, que poderia atirar e matar quem quer que estivesse em seu poder e desliguei o telefone.
É muito fácil reagir dessa forma quando sabemos que nossos filhos estão em segurança, mas enquanto não temos essa certeza é aterrador. Ficamos em pânico e nos sentindo impotentes. Essa é uma experiência que não desejo para ninguém.
Infelizmente estamos a mercê de bandidos de toda natureza. Nas ruas ou nas prisões e até mesmo no nosso Congresso os bandidos estão cada vez mais ousados, cruéis e sem escrúpulos. Estão cada dia mais frios e insensíveis, mais gananciosos. Estão se sentindo protegidos pela impunidade.
Penso com tristeza que não é cadeia o lugar certo para bandido. É abaixo de sete palmos...

Adeus Cateter Recheado de Bactérias

Venci mais uma. Tirei o catéter e já estou me sentindo novinha em folha, não me sinto mais uma chocadeira de bactérias.
Hospital é sempre a mesma coisa: exigem que você se interne na hora marcada, mas nunca cumprem o horário da cirurgia. Dei entrada no Santa Lucia exatamente às 10 horas de segunda-feira, quando fui atendida por um funcionário muito simpático e educado que ficou conversando animadamente e contando suas histórias enquanto outro atendente preenchia a papelada. Naquela hora fiquei sabendo que seria a primeira a ser operada no período da tarde (isso significava, em tese, as 13:30h). Já não fiquei muito satisfeita com a notícia, pois estava em jejum desde as 21 h da noite anterior mas, como diz o velho ditado: o que não tem remédio remediado está. Subi para o apartamento.
O tempo parecia se arrastar com preguiça e nada de dar 13 horas. Eu já estava até bamba de tanta fome e o tempo continuava seu curso sem pressa, mas finalmente deu 13 horas, 13:30, 14 horas e nada, ninguém aparecia para me levar para o centro cirúrgico. A Bárbara, impaciente, ligou para saber o que estava acontecendo e informaram que a cirurgia das 11 horas estava sendo realizada naquele horário e que a minha seria a próxima. Meu estômago deu um ronco forte de fome, minhas mãos tremiam. Como é ruim sentir fome.
Fiquei pensando naqueles milhões pessoas famintas no mundo. Que coisa horrível. É cruel pensar que em pleno século 21 ainda existem pessoas morrendo de fome pelo mundo.
Uma coisa é você sentir fome por um motivo específico, como uma cirurgia por exemplo. Você sabe que poderá comer em algumas horas. É ruim, mas é passageiro. Logo, logo você comerá uma comidinha bem feita e nutritiva. Outra coisa é alguém sentir fome e não ter como comer sequer um pedaço de pão. E pensar que existe tanto desperdício de comida no mundo. Que paradoxal...
Detesto ver quem quer que seja desperdiçando comida ou água. Existe muita fome e sede pelo mundo para nos darmos o direito de jogar fora esses itens preciosos.
Mas voltando ao assunto do hospital, sabe a que horas fui para o centro cirúrgico? 15:30h. Fiz questão de conferir no relógio pendurado na parede. Lá chegando o anestesista veio falar comigo e rapidinho puncionaram minha veia e colocaram o soro. Não demorou muito eu já estava apagada e só acordei horas depois, quando me levaram de volta ao quarto. Correu tudo bem na cirurgia e no lugar onde estava o cateter só restou um corte que em breve estará cicatrizado. Agora é esperar para colocar outro cateter, mas isso fica para o ano que vem.

A Roda da Vida e as Fiandeiras do Destino

O telefone tocou cedo, era a Maura avisando que o Sr. Cesar faleceu. O período em que esteve doente foi de muito sofrimento para ele e também para a família que se sentia impotente, sem ter muito que fazer.
Fui para a janela do meu quarto e fiquei observando o jardim. Um sabiá procurava comida entre as flores coloridas dos canteiros e duas rolinhas brigavam. Acho que era disputa pelo território. O gato Bubu miava sem parar e os passarinhos caminhavam indiferentes enquanto comiam sobras de ração que minha mãe havia jogado entre as plantas.
A vida continua seu curso indiferente ao que acontece à sua volta. É a roda da vida girando sem parar...
Ontem o dia foi tão agradável. Suzi e eu saímos para almoçar com a Maura e de lá fomos passear na feira de natal que está acontecendo no Centro de Convenções. As bancas repletas de produtos natalinos enchiam os olhos, era cada papai Noel mais simpático do que o outro. Havia também anjos, guirlandas, toalhas, panos de pratos, e um montão de outros produtos. A Maura não se conteve e comprou um simpático ursinho branco de presente para a Júlia e um papai Noel para a Suzi. Eu também acabei comprando uma boneca de pano para a filhinha da drª Camila, que nascerá em março.
Demos uma parada no Shopping ID para ver os preços dos sofás e ficamos impressionadas com a carestia. Decidimos que a troca do sofá da sala de TV terá que esperar mais um pouco.
A tarde já estava quase acabando quando deixamos a Maura e seguimos direto para casa. Mal entrei e tive a notícia de que minha querida amiga drª Flora está muito mal na UTI. Foi um choque. Era a última notícia que gostaria de ter ouvido.
Liguei para o Rio e a Elenice confirmou, ela está muito debilitada e só um milagre poderá salvá-la. Elenice, sua escudeira fiel, está inconsolável. Eu também fiquei arrasada.
A vida é uma caixinha de surpresa. Num momento estamos comemorando, rindo e brincando e no momento seguinte podemos estar chorando uma grande perda. É complicado, é assustador, mas é assim que funciona, não há como escapar. A roda da vida não pode parar. Ora está lá em cima, ora cá embaixo. Penso no mito das fiandeiras do destino, as Moiras, na mitologia grega ou Parcas, da mitologia romana. Cloto já fiou um longo destino para minha amiga, pois já se passaram mais de 70 anos, Láquesis lhe deu altos e baixos ao desenrolar esse fio e parece que Átropos anda a espreita...
Meu pensamento é para Deus. Deus ó Deus como devo rezar? Tenha piedade da minha amiga e minimize seu sofrimento. Não permita que ela fique presa numa cama fria de hospital. Se ainda não for sua hora de partir restaure logo suas forças e devolva-lhe a energia. Se, no entanto, for chegado seu tempo liberte-a, dê-lhe asas para voar...
Sei que muita gente pode se horrorizar com um pedido assim, mas viver para mim significa mais do que apenas respirar com a ajuda de aparelhos, principalmente em se tratando de uma pessoa que sempre foi ativa, que vivia tudo no superlativo. A drª Flora não merece viver assim, ela sempre foi uma pessoa muito boa e generosa. Nunca fez corpo mole para trabalhar. Mesmo idosa ainda tinha energia para fazer longos plantões nos hospitais onde trabalhava.
E foi com o coração apertado que participei mais tarde da homenagem ao Sr. Razi, pioneiro da fé Bahai no Brasil, que faleceu há alguns dias. Pouca gente viveu tão intensamente sua fé como ele que dedicou uma vida inteira a divulgação da fé Bahai. Começou muito jovem ao sair do Irã para os Emirados Árabes, quando Dubai devia ser apenas um mar de areia a perder de vista. Que jovem corajoso. Ir falar de religião num país muçulmano. Acabou vindo depois para o Brasil onde se estabeleceu e formou uma bonita família. Guitty, sua esposa, é a pessoa mais doce e acolhedora que conheço. Gosto muito da Guitty.
A morte e sua inevitabilidade se faz presente o tempo todo como a nos lembrar que estamos aqui apenas de passagem. Mesmo sendo a única certeza que temos da vida nunca estamos preparados para ela. Mas aconteça o que tiver que acontecer a roda da vida não para e se continuamos vivos é para viver.

Arteterapia do Instituto Luci Ishii é Tudo de Bom


A Bené vai viajar para São Paulo na próxima semana para apresentar a monografia do curso de pós graduação em psicologia. Chique né! Só 3 trabalhos foram selecionados e o dela está entre eles. Nossa teacher da arteterapia é o máximo. Estamos orgulhosas dela.
Sem a Bené em Brasília resolvemos encerrar nossos encontros semanais de 2009 com um almoço de confraternização na casa da Elisa. Foi ótimo. Ela preparou uma bacalhoada especial que estava uma delícia.
Aproveitamos o encontro para fazer um amigo oculto muito animado, com troca de presentes e muito carinho. Foram muitas brincadeiras e gargalhadas sonoras evidenciando a cumplicidade do grupo de arteterapia. A Bené aproveitou a ocasião para nos ensinar confeccionar um colar feito com fitas que fica lindo.
O trabalho na arteterapia, coordenado pela Bené, traz muitos benefícios para os pacientes que estão em tratamento quimioterápico. O grupo é muito unido e todas se ajudam numa troca animada de experiências, amizade e muita conversa. Em nossos encontros semanais estamos sempre aprendendo algum tipo de trabalho manual ou executando algum trabalho voluntário em benefício de algum grupo de pessoas carentes.
Por ocasião do dia das crianças tivemos oportunidade de customizar camisetas de malha. Foi muito prazeiroso, pois criamos com muito carinho várias estampas, bordados e pinturas que encantaram as crianças e jovens atendidos numa instituição carente. Foram várias semanas de trabalho do grupo.
A iniciativa do Instituto Luci Ishii de oferecer aos pacientes em tratamento oncológico a oportunidade de um encontro semanal para um trabalho lúdico é muito bem recebida. Nossos encontros fortalecem laços de amizade e solidariedade. O grupo está sempre de mãos estendidas e braços abertos para apoiar quem quer que precise de suporte, de um ombro amigo, de um espaço onde se possa chorar sem vergonha, de falar com a certeza de que será ouvido e compreendido. Serve tanto para os pacientes como para seus cuidadores.

Decoração de Natal

Minha mãe está sempre protagonizando alguma história hilária. Hoje, para variar, aconteceu mais uma.
Como a maioria das idosas, Dolorinha, como a chamo, é muito religiosa e além de não dispensar uma missa aos domingos adora uma imagem de santo. Seu xodó sempre foi um Menino Jesus que comprei a anos, no tempo em que eu ainda tinha um salário minguado, e que paguei em suaves prestações. Todo ano essa imagem é destaque na decoração que enfeita a casa na época do natal.
Mesmo apreciando sua imagem do Jesus menino seu sonho de consumo sempre foi o de possuir um menininho, como ela costuma falar, comprado na Espanha. É que ela viveu muitos anos em colégio de freiras onde se acostumou a ver lindas imagens importadas daquele país.
Quando visitei a Espanha a primeira coisa que fiz foi procurar uma loja onde eu pudesse comprar o santo. Rodei aquela Madri de cabo a rabo até encontrar uma grande loja que só vendia materiais sacros. Quase caí dura com os preços, pois qualquer peça custava os tubos, mas desejo de mãe precisa ser levado em consideração...
Fiquei um tempão tentando escolher um Menino Jesus que correspondesse aos sonhos da minha mãe e que não pesasse tanto em meu bolso, pois cada um era mais caro do que o outro. Um horror. Acabei por escolher um muito lindinho, que não era muito grande e nem pequeno demais e assim não iria arrancar meu couro e nem atrapalhar muito na viagem de volta, pois eu teria de carregá-lo na mão para não correr o risco de se quebrar no transporte das malas.
Quando minha mãe abriu seu presente quase teve um treco de alegria. Se tivesse acertado na loteria não teria ficado mais feliz. Ela se sentiu realizada, pois finalmente era dona de um legítimo menininho Jesus comprado na Espanha. Ela chegou a chorar de emoção fazendo valer cada centavo de euro pago pela imagem.
Pois bem, para encurtar o assunto esse Jesus espanhol passou a ocupar o lugar de destaque na decoração natalina e o antigo acabou ocupando uma posição que ela julgava inferior, pois ficava na parte íntima da casa onde só a família costuma circular.
Inconformada, ela resolveu mudar a posição da imagem. Ela colocou uma almofada cheia de frufrus aos pés da árvore de natal que foi montada na sala de visitas e colocou o Menino Jesus em cima.
Nem cheguei a ver a mudança, mas quando ela me falou o que havia feito eu avisei: cuidado com o Bubu. Aquele gato safado vai acabar dando uma boa mijada no menino e você não vai gostar. Ela me olhou com uma cara desapontada, mas não se mexeu.
Eu estava no quarto quando ouvi o barulho de algo se quebrando e um grito da minha mãe seguido de um miado forte e sentido de um gato velho. Era o Bubu reclamando de um bom tapa que levou porque resolveu dormir em cima do Menino Jesus que estava na almofada e não deu outra: derrubou a imagem e quebrou a cabeça e dedos do menininho.
Minha mãe estava uma fera com o gato e não sabia o que fazer para consertar o estrago. Minha irmã tentava consolar minha mãe dizendo que iria colar o santo, mas ela dizia sem parar que santo quebrado não é a mesma coisa. Ela estava inconsolável.
Fiquei bem quietinha em meu canto só imaginando o estrago. Daí a pouco minha mãe aparece na porta e me acusa: Você disse que o gato ia fazer xixi no santo, mas não disse que ele iria quebrá-lo. Não me contive e comecei a rir da situação. O problema é que não estou podendo rir porque começo a tossir. Minha mãe olhou para mim indignada e tornou a me acusar: Você ainda ri da situação. E quanto mais ela se indignava mais vontade eu tinha de rir e mais eu tossia.
Quando minha mãe se deu conta que eu estava ficando sem fôlego por causa da tosse a coitada ficou toda aflita sem saber se me acudia ou segurava o Menino Jesus feito em pedaços. E o safado do gato? Esse não estava nem aí. Já tinha até esquecido o tapa.

Quem enfia a mão em cumbuca...

O ano está acabando, hoje já é primeiro de dezembro. Mal começou 2009 e parece que num piscar de olhos está chegando seu fim: daqui alguns dias é Natal e pronto, outro Ano Novo já estará sendo anunciado com fogos e fanfarra. Será que merece tanta comemoração? Entra ano, sai ano e as coisas continuam acontecendo da mesma forma, nada muda, nem mesmo a esperança de dias melhores...
Na política a coisa anda de mal a pior. Agora o Arruda se ferrou de verde e amarelo, pois foi apanhado com a mão na cumbuca. Todo mundo assistiu o infeliz recebendo aquele montão de dinheiro. Não adianta fingir que não aconteceu e muito menos dizer que o dinheiro era para comprar panetone (sobrou para Papai Noel). Claro que armaram para ele. No mínimo alguém não andava feliz com a parte que estava recebendo e resolveu botar a boca no trombone. Será que a condição para se entrar na política é ser safado? Pelo jeito não escapa ninguém. É tudo farinha do mesmo saco.
Alguma coisa precisa ser feita. Se foi pego roubando merece é cadeia mesmo. Engraçado é que se for um pobre coitado qualquer, como muitos que já viraram notícia, basta passar a mão num pote de iogurte para amargar meses de cadeia. Político rouba milhões e a única coisa que acontece é ficar rico ou, se já nasceu em berço de ouro, fica mais rico ainda.
Não estou triste nem pessimista, estou simplesmente dizendo a verdade nua e crua. Mesmo indigesta é esta a verdade que vem acontecendo em nosso querido Brasil varonil.
O povo precisa é de educação e cultura para aprender a votar, para aprender a questionar e não acreditar que basta uma cesta básica, uma blusinha ou um boné. Essa história de bolsa família, bolsa isso, bolsa aquilo não resolve o problema da pobreza e da miséria. Isso só será resolvido com ação, com educação, com oportunidade de emprego e remuneração decente. Pensaram até em bolsa celular, lembram? É demais para meu pobre coração.
É melhor mudar de assunto porque política é muito indigesto. Aguardemos os próximos capítulos dessa novela mexicana...
O resultado do exame de cultura do sangue ficou pronto ontem e as notícias não são animadoras, pois existe mesmo uma bactéria em meu catéter. Uma não, um montão delas e não me agrada nadinha a idéia de ser chocadeira de bactérias. Só em pensar que tem um montão de bichinhos se multiplicando dentro de mim dá até arrepios. Cruzes!
Por menos que a idéia me agrade será mesmo necessário entrar mais uma vez no centro cirúrgico para retirar o catéter contaminado. Hoje vou conversar com o Dr Bruno, especialista em catéter, para acertar a cirurgia. Precisamos correr contra o tempo. Quero estar novinha em folha o quanto antes.
Estive na clínica e encontrei a Mororó e o marido. Quando falei da contaminação do meu catéter o marido dela contou que aconteceu a mesma coisa com ela e que ela também terá que retirar o catéter que foi trocado há menos de dois meses. Pode? É de deixar qualquer um furioso, para não falar coisa pior. Ah, ela também sentiu aquela tremedeira descontrolada que tive durante a quimio. A coitada sequer teve a assitência necessária para superar o problema. Um verdadeiro absurdo. Só quem passa por isso sabe o tanto que é ruim.
Parece que a bruxa anda solta, mas espero que não apareça mais ninguém contaminado, senão vou pensar que é outra pandemia... Cruz credo.

Uma Música Despertando Lembranças...

Acabei de chegar da igreja aqui perto de casa, onde fui assistir a missa. O Padre perguntou várias vezes se as pessoas presentes estavam realmente dentro da igreja ou se o pensamento estava em outro lugar. Até sorri quando ele fez a pergunta da primeira vez porque confesso que eu tinha acabado de tentar me concentrar na missa, pois tinha me dado conta de que estava longe, muito longe dali.
Durante a missa muitas músicas foram cantadas e eu adoro cantar. Tentei acompanhar baixinho porque minha voz está falhando, mas cantei com o coração. Quase no final da missa cantaram uma música antiga, que eu costumava cantar na capela do colégio de freiras onde estudei durante toda minha infância e adolescência. Num instante me senti transportada no tempo. Não consegui resistir...
Fechei os olhos e me vi menina e depois jovem assistindo missa. Consegui sentir até o cheiro característico da capela do colégio da minha infância tão distante. Vi os bancos de madeira muito polidos, o chão claro imaculadamente limpo, o altar em mármore e os detalhes em azul e branco no fundo do altar feito em madeira. As lindas e enormes imagens da Virgem Maria e de São José ocupavam um lugar de destaque na capela. Senti saudades.
Não resisti e continuei um pouco mais na minha infância. Revi mentalmente algumas colegas daquela época que eu nunca mais encontrei. Onde andarão? Pensei em algumas amigas queridas e especialmente na Tati, na Lourdes e na Rita. Faz tanto tempo que não as vejo. Com a Tati ainda falo às vezes ao telefone. Sinto um carinho especial por elas.
O título da música que me transportou no tempo é Belo e se canta assim:
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Belo pra mim é criança a brincar
É ouvir mil canções numa concha do mar
É a chuva caindo, é o campo em flor
E acima de tudo é o amor ô ô ô ô ô ô...
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Belo pra mim quando estou a sofrer
E as trevas na alma começam a crescer
Lembrar com alegria que além muito além
A espera de mim existe alguém
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A música parou e como num passe de mágica eu estava de volta à missa do domingo. Algumas crianças fizeram uma apresentação e em seguida a missa chegou ao seu final. Ficou um gostinho de saudade daquele tempo que não volta mais...

Porque estou engasgando e tossindo tanto?

Continuo fazendo fono e buscando a causa da tosse, dos engasgos e da rouquidão. Porque será que somente agora, depois de mais de dois anos com a prega vocal paralisada esses sintomas apareceram? O pior é que estão piorando visivelmente. Cada uma que me aparece...
Na próxima semana vou fazer alguns exames com uma otorrino da confiança de minha fono. Vamos ver o que descobrimos. Quero voltar a comer em paz e a falar sem tossir tanto. É complicado engasgar enquanto se come. Todos à sua volta ficam aflitos. Além do mais todas as comemorações acabam sendo em torno da comida e não tem graça nenhuma ficar só olhando. Não sou gulosa, mas gosto de uma comidinha bem feita.
Hoje meu corpo doeu muito por causa dos efeitos do zometa. Cada pedacinho doia sem dó nem piedade. Tomei remédio para dor e acabei dormindo mais de três horas direto. Dormi sem almoçar, pois o sono era maior do que a fome, mas acordei muito melhor, apenas um pouco pesada.
Só não me revolto com esse remédio porque sei que é eficaz e está reconstruindo o osso destruído pelo câncer, mas que ele é cruel isso ele é. Parece que moi cada pedacinho do meu esqueleto e a dor fica generalisada. O pior é que os ossos atingidos pela doença são inoperáveis. Não é possível simplesmente cortar e substituir por metal, pois o esterno, vértebra e costelas são insubstituíveis; preciso cuidar bem dos que tenho.
A Bárbara conseguiu retornar ainda ontem do Piauí. Disse que foi uma correria, mas resolveu tudo muito bem, pois os servidores do tribunal são atenciosos, eficientes e gentis. Voltou carregando um enorme calhamaço de papéis, resultado positivo do que foi fazer em Teresina.
Sua passagem pela capital foi rápida, além do trabalho no tribunal só teve tempo de ver o encontro das águas escuras do rio Parnaiba, que segue até o Delta do Parnaíba e do rio Poti com suas águas esverdeadas, no Parque Ambiental do Encontro dos Rios. Lá ficou conhecendo a lenda do Cabeça de Cuia.
Diz a lenda que um jovem pescador chamado Crispim um dia chegou em casa e, encontrando apenas um caldo de ossos para comer, bateu descontroladamente em sua mãe, revoltado. Antes de morrer, a senhora amaldiçoou o filho, rogando-lhe uma praga – ele se transformaria em um monstro medonho. Sentindo um terrível remorso, Crispim se jogou nas águas do rio Poti. Os moradores mais antigos afirmam que nas noites de lua cheia, ele fica zanzando pelas margens do rio, tentando se livrar do encanto. Para poder descansar em paz, o Cabeça de Cuia – nome pelo qual ficou conhecido devido à sua enorme cabeça deformada - deveria devorar sete moças virgens de nome Maria, mas nunca conseguiu pegar nenhuma. Até porque nenhuma moça anda sozinha por aquelas bandas.
Na hora do almoço a Bárbara perguntou se o prato era para uma pessoa. O garçon afirmou categoricamente que apenas uma pessoa comia a porção servida. Ela pediu peixe, seu prato predileto. Quando chegou a comida levou um susto, pois a quantidade servida dava para alimentar, no mínimo, três pessoas. Pelo jeito os piauienses são bem gulosos...

Bonsai em Flor

Ontem foi mais um dia de quimio. Não pude usar o cateter por causa da suposta bactéria, mas a Janúcia foi perita em pegar uma boa veia periférica. Dormi durante todo o tempo, pois estava me sentindo muito cansada.
Dependendo do resultado dos exames será necessário retirar o cateter. Vou precisar correr contra o tempo, pois se isso for mesmo acontecer quero fazer tudo antes do natal. Final de ano é época de festas, de confraternização, nada a ver ficar pensando em cirurgia.
Mudando de assunto, a Bárbara continua em estado de bobagem com o carro novo. Ela está encantada. Ontem precisou viajar a trabalho para o Piauí. Foi uma correria danada para chegar ao aeroporto, mas deu tudo certo no final das contas. Ela deverá retornar ainda hoje, pois parece que conseguiu resolver tudo que precisava em Teresina.
Uma das vantagens de estar livre e desimpedida é poder viajar assim de uma hora para outra, sem precisar se estressar com o que quer que seja. Basta aparecer uma emergência para se fazer as malas e embarcar seja lá para onde for. Quando se tem filhos, marido ou até mesmo um namorado ciumento não é tão simples assim.
Acabei de ver que meu bonsai de romã, que estava todo feinho e tristonho, está cheio de botões. Ele ganhou força depois da poda que recebeu e está lindo. Tomara que o mesmo aconteça com o pé de limão.
Caiu uma chuva forte durante a noite e outra agora pela manhã. O jardim está todo verdinho. A natureza está em festa. Gosto da chuva, do barulho da água caindo e molhando a terra. Ela renova a vida.

Realizar Sonhos é muito bom


Depois do sufoco da última quarta-feira andei a pensar mais do que o de costume. Realmente a vida é um fio muito tênue, mas vale a pena ser vivida. Todos temos altos e baixos. Todos sentimos dor, raiva, alegria, frustração, tristeza ou qualquer outro sentimento inerente a esse complexo SER. Seja lá como for vale a pena viver. A vida pode até ser breve, mas há que ser intensa.
Quanto mais difíceis as situações inesperadas no transcorrer de meu tratamento mais valor consigo dar a esse caminhar incerto, mais intensos são meus sonhos, mais forte minha determinação. Não sou mesmo de entregar os pontos. Prefiro vergar até encostar a cabeça no chão como faz o bambu a me quebrar como um carvalho forte que resiste ao vento.
Estou aguardando o resultado dos exames para ver o tipo e onde está a bactéria que provocou o piripaque. Ela até pensou ter ganho uma batalha, mas eu vou ganhar a guerra.
O final de semana se arrastou com preguiça, a segunda-feira parecia nunca chegar. É que eu estava doida para ver a carinha da minha filha quando recebesse o carro novo que resolvi comprar. O Fox 1000 que ela tinha estava cada dia pior; além de não desenvolver o carro andava morrendo sem motivo aparente. Levamos para a concessionária resolver o problema mas, para variar, os machistas e indelicados funcionários sempre insinuavam que o verdadeiro problema do carro estava entre o volante e o banco. A Bárbara só faltava morrer de raiva e não vale a pena. Achei que o melhor é evitar o confronto, evitar a raiva e arranjar um motivo para ser feliz. Foi aí que decidi comprar um carro novo e, de preferência um carrão.
Dei uma de metida e comprei logo um Peugeot 307 novinho. É um carro confortável e com todos os ítens de segurança que eu queria. O motor silencioso lembra o ronronar de um gatinho manhoso e ele desenvolve que é uma beleza.
A segunda demorou mas acabou chegando e lá fomos nós para a concessionária. Ela ia toda inocente pensando que apenas me fazia um favor e quando se deu conta do que estava de fato acontecendo quase não se conteve de alegria. Custou a acreditar que estava saindo de um Fox fraquinho para um carrão daqueles. Ela olhou fixamente para o carro, passou a mão na lataria, abriu todas as portas, acendeu as luzes e por fim girou a chave. Parecia uma criança com seu brinquedo novo. Seu rosto irradiava alegria, seu sorriso era puro contentamento.
Fiquei feliz com a compra, mas posso garantir que a Bárbara ficou ainda mais feliz com o presente. Foi inevitável concluir que são essas coisas que fazem a vida valer a pena. Realizar sonhos, sejam os nossos ou dos outros, é bom demais.

Minha Velha Árvore Morreu

Doeu em meu coração ver minha velha árvore do cerrado sendo cortada porque simplesmente morreu de uma hora para outra. Pedi para o jardineiro não cortar o tronco onde estão algumas orquídeas. Ficou um enorme vazio em frente a janela do meu quarto.
Também pedi ao jardineiro para fazer uma poda radical no limoeiro para ver se ele se recupera, pois também está morrendo. O limoeiro sempre foi uma árvore abençoada, pois vivia carregado de muitos limões enormes e suculentos. Todos adoravam o suco de seus frutos. O que estará acontecendo com minhas árvores? Gosto tanto delas. Árvore dá vida e embeleza qualquer ambiente e é muito triste vê-las morrendo.
Saí cedo pela manhã para começar a fazer os exames que a Drª Fabiana pediu para ver onde está alojada a bactéria que me atacou na quimio de quarta-feira. Fui até o Sabin do Deck Brasil, onde trabalha a Maria Luiza, mas lá não foi possível fazer aquele tipo de exame. Precisei tirar o sangue no Sabin do Hospital Brasilia. Ainda bem que o Silvio trabalha lá, pois ele também é ótimo para achar uma veia difícil.
Fui também até a Clinica da Drª Luci para que a Marilene pudesse retirar o sangue do catéter para análise. A clínica estava muito movimentada hoje pela manhã.
Chegando em casa a primeira coisa que vi na calçada foi minha velha árvore toda partida em pedaços. No jardim o Baiano podava o limoeiro e uma sabiá voava de um lado para o outro como se também ela estivesse indignada com o corte das velhas árvores.
Cheguei perto do tronco do limoeiro e falei para ele que não era maldade o que estávamos fazendo, era uma tentativa de salvá-lo da morte certa. Tomara que a medida dê certo.
Assim que o Baiano terminou de colocar os galhos do limoeiro na calçada para que a caçamba os recolhesse uma forte chuva caiu. Era o céu chorando a morte das árvores do meu jardim...

Uma tremedeira sem controle

A bruxa anda solta mesmo. Hoje tive um piripaque durante a quimioterapia.
Começou do nada. Eu já estava recebendo a quimio quando comecei a sentir muito frio. Peguei um edredon e me agasalhei, mas não adiantou nada. O frio piorou e o corpo todo começou a doer. De repente comecei a tremer sem controle e não sei se chorava ou apenas lacrimejava, mas eu sentia as lágrimas quentes descerem pelo meu rosto. Os dentes chacoalhavam freneticamente uns contra os outros. Os braços e pernas batiam contra a cadeira reclinada sem que eu conseguisse contê-los.
Num instante o meu box estava cheio. A enfermeira chefe correu para fechar o cateter e foi aferir minha pressão que nessa altura já estava com a máxima em 19. Colocaram aquele aparelho que mede a frequência cardíaca, ele bipava sem parar e eu tremia feito vara verde. Não dava para controlar o tremor. Eu me sentia como se estivesse presa num barril fechado que havia sido jogado numa corredeira... Meu corpo não me obedecia. Eu não conseguia concatenar os pensamentos.
Naquela correria frenética dos médicos e enfermeiros tentando me estabilizar eu só distinguia a voz suave da Drª Camila me pedindo para ter calma e que estava tudo sob controle. Mediram minha temperatura e injetaram alguma coisa para controlar os tremores e a dor. Os tremores não cessavam. Eu estava exausta e sentia a energia fugindo do meu corpo a cada minuto.
Não sei quanto tempo demorou para que eu fosse estabilizada, creio que não foi mais do que uns 15 minutos, mas para mim parecia uma eternidade. Disseram que os sintomas eram de uma bacteremia e que devia vir do catéter. Alguma bactéria pode ter se alojado ali, se multiplicou, e quando começou a quimio ela invadiu a corrente sanguínea provocando o colapso.
Ainda fiquei algum tempo sentindo frio, mas as dores foram cedendo bem como os tremores. De vez em quando eu sentia os braços e as pernas tremerem sem controle, mas nada comparado ao corpo inteiro tremendo loucamente.
Minha irmã e minhas amigas da arteterapia foram chegando assustadas. Num primeiro momento nem tinham percebido que era comigo e tão logo se deram conta disso ficaram mais assustadas ainda. Olhavam para mim como que para se certificarem de que eu estava bem e que tudo não passara de um susto. Eu estava tão exausta que mal conseguia falar para acalmá-las.
Numa hora dessas você percebe claramente a fragilidade da vida. Num minuto você está bem e no minuto seguinte pode simplesmente entrar em colapso... É assustador.
Depois que tudo passou a Drª Fabiana veio falar comigo. Ela brincou, mas acabou afirmando que realmente os sintomas que tive levam a crer que o problema foi uma bacteremia. Vou precisar fazer alguns exames para avaliar se é isso mesmo. É provável que seja algo assim porque ando tendo umas infecções de repetição de uns tempos para cá. Meu braço direito, que não tem gânglios linfáticos, continua inchado por causa disso.
A Marilene precisou puncionar uma veia para contiuar a quimio. A Janúcia, como sempre, foi atenciosa e muito carinhosa comigo. Por causa do problema que tive precisei tomar mais soro do que o usual, mas agora estou bem e é como se nada tivesse acontecido. Ainda bem.

Viagem de Trem Curitiba-Morretes


Lili, Suzi e eu estávamos visitando Curitiba e resolvemos fazer o passeio de trem até Morretes. Era uma sexta-feira, acordamos cedo, tomamos nosso café da manhã e em seguida a van chegou para nos pegar. O grupo era pequeno: apenas nós e um casal de Salvador, todos hospedados no mesmo hotel.
Seguimos para a estação ferroviária e enquanto aguardávamos a chegada do trem nosso guia ia contando a história da ferrovia que liga Curitiba a Paranaguá. O engenheiro responsável pelo projeto foi Antonio Pereira Rebouças Filho, especialista em construção de estradas de ferro e portos marítimos.
A estrada de ferro foi criada em 1880, possui 110 km de extensão que descem 900 metros da serra do mar até o Porto de Paranaguá. O trem passa inicialmente por Pinhais e Piraquara para logo em seguida chegar ao túnel Roça Nova, o primeiro dos 14 túneis do percurso.
Assim que deixou a estação o trem apitou várias vezes como se estivesse feliz com o início de uma nova viagem. Ele descia a serra bem devagar, o que nos permitia apreciar a paisagem verde e exuberante da Serra do Mar.
Depois que passamos pelo primeiro túnel a enorme cachoeira Véu da Noiva apareceu com toda sua beleza. Ela cai de tão alto que mesmo com o barulho do trem conseguimos ouvir o som da queda d’água.
São 3 horas de viagem e nem nos damos conta disto tamanha beleza natural que se descortina além das janelas do trem. Passamos pelo Parque Nacional do Marumbi, criado em 1990, com mais de 2.300 hectares. Vemos o Morro do Leão e o Pico Marumbi, freqüentado por alpinistas. Atravessamos 30 pontes e vários enormes viadutos.
Uma guia dentro do vagão, além de distribuir lanches para todos os turistas, também vai relatando a história da ferrovia bem como alertando para esta ou aquela beleza que aparecerá logo adiante. Todos ficam a postos com suas potentes máquinas fotográficas.
De vez em quando o trem precisa parar para que outro trem, que vem subindo a ferrovia desde Paranaguá, tenha lugar para passar. O trem de cargas desce até o porto com menos de 50 vagões carregados de produtos para exportação. Na subida ele pode carregar quase o dobro de vagões.
Ao longo do percurso uma infinidade de plantas se exibe em toda sua beleza. A samambaiaçu, ameaçada de extinção pela extração em larga escala para se fazer o xaxim, cresce livre pela encosta e nos grotões. Hoje é proibida sua extração. Vemos uma profusão de hortências, de origem asiática e que se adaptou perfeitamente por aqui. Outra flor que também não é originária do Brasil e que se adaptou na serra virando uma verdadeira praga é a chamada lírio do brejo, que dá uma flor branca. Ela acaba sufocando e matando outras espécies de plantas de pequeno porte.
E o trem continua seu percurso lento por trilhos tão antigos. Num trecho coberto por espessa neblina e onde os trilhos ficam suspensos por enormes pilares de concreto o trem parece flutuar solto no ar. Eu e meu medo de altura não combinamos muito com essa parte do trajeto...
As três horas de viagem passam céleres, ninguém percebe e quando menos esperamos já estamos parados na estação de Morretes prontos para o desembarque.

Passeando em Curitiba


Viajei na quinta e ao retornar encontro uma surpresa desagradável: uma das árvores do meu jardim, exatamente aquela do cerrado que eu fiz questão de preservar para continuar alimentando os passarinhos com seu frutinho amargo, morreu de uma hora para outra. Simplesmente morreu. O que será que aconteceu???
Acho que alguma coisa anda muito errada com o solo do meu jardim. O pé de limão também está morrendo. Já me disseram para podá-lo e assim ver se ele toma forças para desabrochar novamente. Tomara que dê certo.
A viagem para Curitiba foi boa, apesar do tempo quente e abafado.
Aproveitamos nossa estada por lá e na sexta-feira fizemos um passeio de trem. São 3 horas de viagem pela Serra do Mar de Curitiba até Morretes. A volta foi de carro pela Estrada da Graciosa.
No sábado pegamos o ônibus de turismo que passa em frente ao hotel e saímos pela cidade. Nossa primeira parada foi no Jardim Botânico, considerado a marca registrada da cidade. O local é agradável, mas eu esperava ver mais espécimes botânicas. A estrutura metálica no final de um jardim muito bem cuidado chama a atenção mas decepciona um pouco quando a conhecemos por dentro. É relativamente pequena e abriga poucas plantas.
A segunda parada foi no Museu Oscar Niemeyer, o museu do olho. Projetado por Oscar Niemeyer, é considerado o maior e mais moderno museu do Brasil. É realmente interessante quando visto de fora, mas as obras que ele abriga não tocam minha sensibilidade. Não gosto muito de arte moderna e contemporânea. Não consigo entender, por exemplo, uma tela grande toda pintada com uma tinta escura. Isso é arte? O nome da obra é: Sem título. Claro. Que título pode ter uma obra assim??? Algumas obras, aos meus olhos leigos, mais parecem um deboche do artista com os apreciadores de arte. Não entendo, não gosto e por mais que digam ser arte continuo não gostando.
Saímos do museu e fomos para a Ópera de Arame. Antes da visita paramos para almoçar porque ninguém é de ferro e já estávamos mortas de fome. Resolvi experimentar um prato típico polonês chamado pierogue, uma espécie de pastelzinho feito de batatas com recheio de queijo. Não gostei. A apresentação do prato não era das melhores e o molho de calabresa não passava de pedacinhos minúsculos da iguaria jogados por cima dos pastéis. A apresentação da comida, pelo menos para mim, é fundamental. Encaro comida feia com a maior má vontade.
A Ópera de Arame é um palco feito de uma estrutura tubular. É lá que acontece grandes apresentações artísticas e culturais da cidade. O bonito do local é a integração com a natureza. A pedreira ao lado da ópera, o lago que circunda o espaço, as árvores e flores, tudo combinado faz da Ópera de Arame um lugar agradável.
Saindo de lá resolvi retornar direto para o hotel porque já estava muito cansada. Lili e Suzi ainda fizeram mais uma parada na Torre Panorâmica, uma torre de telefonia com mirante aberto para visitação. São 109 metros de altura. O mirante é fechado com vidro e oferece uma vista de 360° da cidade.
A noite o Cid veio nos visitar no hotel e acabamos saindo para jantar. Ele estava sem poder mastigar por causa de uma cirurgia na boca para implantes dentários e acabou comendo apenas uma omelete. Coitado do Cid, guloso como ele é ficar sem poder comer direito é um castigo.
E o domingo amanheceu estranho. A temperatura caiu um pouco, mas a atmosfera estava pesada. Parecia anunciar uma forte tempestade para mais tarde. Fui assirtir a missa das 8:30h quando comecei a sentir dores pelo corpo. Saí da igreja, encontrei com a Lili e fomos passear pela feira de artesanato que funciona aos domingos, bem atrás da igreja. Já tinha andado um bom pedaço quando percebi que não tinha mais condições de continuar. Deixei a Lili com a Suzi andando pela feira e voltei para o hotel. Lá chegando tomei um analgésico e me deitei. Eu tremia de frio e dores pelo corpo. Sequer consegui sair para almoçar. Fiquei deitada esperando que o remédio fizesse efeito. Demorou, mas as dores foram cedendo e comecei a me sentir melhor. Ainda bem porque nosso vôo de volta para Brasília era às 17 horas.
Assim que cheguei em casa liguei para o Cid e ele contou que tão logo saímos de Curitiba uma tempestade, com muito vento e trovoada, assutou a cidade. Em alguns lugares do sul do país a chuva causou muitos estragos.

Preparando para viajar

Ontem fui a consulta com Drª Luci e saí muito animada, afinal ela confirmou que os últimos exames aos quais fui submetida mostraram uma melhora excelente em meu estado geral. Devagar estou alcançando o objetivo de ficar curada.
Só fiquei um pouco frustrada porque apesar da melhora, ou por causa da melhora, ela resolveu não alterar o protocolo do tratamento que estou fazendo. Ainda será necessário continuar fazendo quimios semanais. É melhor não mexer em time que está ganhando.
Os últimos dias foram bastante movimentados. Minha amiga que está internada teve algumas crises e precisou ser medicada. Já era esperado que acontecesse dessa forma, mas mesmo assim essas crises acabam afetando a todos que gostam dela. Ficamos apreensivos e sem saber o rumo certo a tomar.
Acabei de voltar da quimioterapia. Novamente não participei da arteterapia pela manhã porque minha mão ainda está muito inchada. Estou fazendo drenagem linfática mas o edema está insistente. Preciso usar uma luva para ajudar na circulação, mas como não gosto de nada me apertando está sendo difícil usá-la por muitas horas.
Quero parar de pensar em problemas de saúde e me concentrar na viagem que farei amanhã cedo para Curitiba. Vamos eu, a Lili e a Suzi. Estou animada, pois só de sair um pouco já me sinto outra. Adoro viajar.
Tomara que o tempo esteja favorável e sem chuva, pois viajar com chuva não é a melhor coisa do mundo. Queremos pegar o trem até Morretes e com tempo bom fica muito mais agradável. O passeio vale a pena e a paisagem da Mata Atlântica é imperdível. A única coisa que não pretendo repetir é comer o barreado, comida típica do litoral paranaense.
Para quem não conhece, o barreado é uma comida feita a base de carne cozida servida com arroz e farinha de mandioca. O segredo está no cozimento em panela de barro por cerca de 20 horas, ou o suficiente para desfiar toda a carne. A panela é vedada com uma massa de farinha e água para manter o vapor dentro da panela.
Morretes é uma cidade história que fica encravada aos pés da Serra do Mar. A estrada de ferro que sai de Curitiba até Paranaguá, passando por Morretes, é considerada uma obra prima da engenharia. Foi construída durante o império e urbanizada em 1950.
Agora vou arrumar minha mala. Depois conto como foi o passeio.

O silêncio dos domingos

Gosto do silêncio que amanhece em minha casa no domingo. É que não abre a academia que funciona ao lado da minha casa e não acordo com as vozes altas de seus frequentadores que começam a chegar a partir das 6:30 da manhã, já cheios de adrenalina e falando alto como se estivessem num mercado persa.
Fico impressionada com a falta de educação generalisada. As pessoas estão, a cada dia que passa, mais egoistas, mais voltadas para seu próprio umbigo. Já reclamei várias vezes do barulho da academia e todos os dias é a mesma coisa: o pessoal chega falando alto e as vozes, no silêncio da manhã, rasgam o ar e entram direto em minha casa. Parece que estão conversando dentro do meu quarto. Odeio isso.
A academia é uma vizinha incômoda. Alguns professores dão aulas aos berros como se todos os alunos fossem surdos de nascença. A música é outro tormento. Se ainda fosse uma música boa, mas não, é aquela batida irritante que deixa qualquer um louco.
Acho que a academia e seu barulho irritante me incomodam tanto que deixei de frequentá-la. Simplesmente não consigo mais ir a academia. Passei a detestar.
Meu exercício predileto é caminhar. Adoro caminhar sem pressa de chegar. Caminho no finalzinho do dia, quando o sol está se pondo. Acho muito bom ir observando a natureza a minha volta, as pessoas indo e vindo e até o movimento ininterruptos dos carros passando. É muito diferente de uma academia com seus frequentadores tarados por corpos malhados, sarados... É sempre o mesmo assunto, as mesmas piadas. Frequentador de academia parece ter sido criado em série: é tudo igual. Os assuntos que rolam na academia são tão profundos quanto um pires... Além do mais não consigo entender a incoerência: falam tanto em saúde, mas exageram nos exercícios, nas noitadas, nas bebidas e nos remédios...
Mas gosto mesmo é do silêncio dos domingos. Quando o dia começa a acontecer só se ouve o canto dos pássaros. É uma verdadeira sinfonia. Depois, quando o sol esquenta fica apenas o silêncio...

Suposto filhote é na verdade um bacurau adulto



Os soldados da polícia ambiental acabaram de recolher o pássaro estranho. Quase morri de vergonha quando eles disseram que o animal não voava durante o dia porque possui hábitos noturnos. Sua atividade é restrita do entardecer até o clarear do dia seguinte. E mais, ele não é um filhote, já é uma ave adulta. Santa ignorância!
O passarinho é um tipo de bacurau. Fui pesquisar na internet e ri de mim mesma. O vôo baixo, que eu pensei ser porque o bichinho estivesse ferido, é uma característica do animal que fica escondido no chão em meio a vegetação fechada. Quando ele precisa se deslocar o faz voando baixo entre os arbustos, para se esconder.
O bacurau, como a coruja, é responsável pelo controle de insetos. Sua presença na natureza é importante.
Coitado do passarinho. Ficou preso alguns dias sem necessidade.
Ficou mais do que comprovado que não podemos nos meter a criar animais que não conhecemos. Se eu não tivesse acionado a polícia ambiental o coitado do passarinho ia acabar morrendo.
Ainda bem que os soldados são pessoas treinadas e muito educadas. Eles não se abalaram e recolheram o pássaro com todo cuidado para devolvê-lo a mata. Eu me desculpei por tê-los ocupado desnecessariamente, mas eles apenas disseram que é parte do trabalho deles. Que atenderão sempre todos os pedidos de resgate que se fizerem necessários.
Eles aproveitaram para mostrar um filhote de carcará que recolheram no Guará e outro filhote, bem pequenino, de gavião. Eu não poderia perder a oportunidade para tirar algumas fotos do carcará que é um pássaro lindo. Nunca tinha visto um tão de perto.
Hoje foi um dia muito movimentado para a polícia ambiental. Eles resgataram uma capivara no espelho d'água do Congresso Nacional, outra que havia sido atacada por cachorro e tentaram, sem sucesso, resgatar um jacaré na cabeça da pista do aeroporto. Já tinham capturado o carcará e outros animais como uma jibóia. E olha que eles só possuem uma única viatura para fazer todo o serviço. Ainda bem que são muito eficientes.
É muito bom conhecer profissionais como os soldados da polícia ambiental. A corporação está de parabéns.
06/11/2009

Sexo e Mastectomia

Há algum tempo escrevi um texto onde eu falava de sexo. Não um sexo casual ou apaixonado, com o parceiro certo ou uma pessoa qualquer. Eu me referia a sexo com uma mulher mastectomizada e todos os tabus e complexos que envolvem o ato. Vou dividir meu texto com vocês
.
Quem descobre ter câncer fica sempre apavorado, mas câncer de mama deixa muitas mulheres mais apavoradas ainda por causa da mutilação. A retirada da mama, para a maioria delas, é um problema quase sem solução.
Não foi o meu caso. Precisei fazer mastectomia radical, mas no mesmo procedimento cirúrgico fiz a reconstrução da mama com o músculo da barriga. Ficou perfeito, só faltando o mamilo que até hoje não tive ânimo para fazer. Só de pensar em enfrentar um centro cirúrgico me dá arrepios. Só entro naquela sala se não houver outra alternativa.
O grande problema enfrentado pelas mulheres mastectomizadas é o medo de expor seus corpos. Elas imaginam a rejeição estampada no rosto do parceiro ou acabam vendo mesmo essa rejeição. Isso gera outro problema, o sexo vira um terror. Só o simples pensamento de se despir e mostrar um corpo sem mama manda a libido pra muito longe. Elas ficam apavoradas e seus parceiros muitas vezes não sabem como lidar com a situação.
Muito desse medo está associado a essa apologia aos corpos perfeitos, malhados, sarados... As academias estão dando cria pelo mundo. Por todos os lugares aonde vamos encontramos academias prometendo corpos perfeitos. Os centros especializados em cirurgias estéticas e plásticas fazem até pacotes que podem ser quitados em suaves prestações para permitir que mulheres sem muitos recursos tenham a chance de fazer uma lipoaspiração ou outro procedimento qualquer (muitas vezes, ou na maioria das vezes, absolutamente desnecessário).
Uma mulher que precisou retirar uma das mamas e algumas vezes as duas enfrenta um grande problema com sua auto estima.
No meu caso precisei retirar apenas uma das mamas. O problema maior para mim eram as inúmeras cicatrizes espalhadas pelo corpo e também a retirada precoce do útero. Eu achava que não conseguiria mais ser uma mulher por inteiro depois de tantas cirurgias, radioterapia e quimioterapia. A minha libido parecia ter adormecido em berço esplêndido...
Um dia conheci um homem aparentemente rude até o momento que você o conhecia melhor. Era um homem negro, grande e forte. Seu olhar era meigo, o que contrastava com sua aparência rude, suas mãos enormes sabiam ser delicadas. Não chegamos a ter nenhum envolvimento mais íntimo, mas com seu carinho e cuidados percebi que ainda pulsava uma mulher dentro de mim.
Passado um tempo acabei me envolvendo com um rapaz mais jovem do que eu. Foi muito bom enquanto durou. Ele era muito ciumento e o que eu menos precisava depois de enfrentar um tratamento tão longo e doloroso para me curar de um câncer era me preocupar com ciúmes do parceiro. Isso, aliado a imaturidade, foi o que nos afastou.
O que ficou de bom nesse relacionamento foi compreender que cicatrizes ou uma falsa mama não fazem a menor diferença. O sexo não fica melhor ou pior porque temos um corpo sarado ou com excesso de gordurinhas localizadas. O sexo é bom quando estamos em sintonia com nosso parceiro. Para eles não faz a menor diferença um corpão violão, magrelo ou gordinho. Nós é que fazemos um drama desnecessário com os corpos que temos.
Além do mais, pode ter certeza, mulher gostosona serve apenas para ser exibida para os amigos. Na hora do vamos ver o que conta mesmo é a química entre os dois. Portanto, pode desencucar e exibir o corpinho do jeito que ele está, mesmo faltando pedaço ou cheio de cicatrizes. Quando rola um clima isso não faz a menor diferença.
Hoje, se alguém se interessa por mim não fico preocupada com o que ele vai pensar do meu corpo. Se me quiser terá que ser com o corpo que tenho, no mais, eu me garanto...
Lou Montes
6/12/2009

Uma Visita Inesperada


Como não estou podendo participar da arteterapia por causa da mão inchada resolvi fazer a quimio na parte da manhã. Em seguida fui de carona com a Elvira até a casa da Helena onde passei a tarde.

Depois do almoço resolvemos ir até a Casa Cor, que está terminando hoje, para conferir as novidades em decoração. Eles conseguiram dar uma boa guaribada no Clube do Servidor que estava totalmente detonado. O jardim ficou agradável e vários ambientes estavam muito bem bolados. Exageros à parte, sempre vale a pena conferir a Casa Cor.

Voltamos para casa, mas antes demos uma passadinha na casa da D. Luci para falar um oi. Comentei com ela sobre o filhote de passarinho que caiu no meu jardim e ela contou que na semana passada recebera uma visita inesperada. Um gambá entrou no apartamento dela. Detalhe: ela mora no 5° andar. Ninguém conseguiu entender como um gambá conseguiu chegar no 5° andar de um bloco de apartamentos em plena Asa Sul.

O resgate de um filhote de, quem sabe um gavião é bem menos pitoresco do que ter um gambá na sala de um apartamento. Dª Luci contou que foi um verdadeiro auê o resgate do bicho feito pela polícia ambiental. O gambá mostrava os dentes, tentava morder, fugia para debaixo dos móveis driblando os policiais. Ela não sabia quem corria mais, se eram os homens ou o gambá.

Uma hora e meia depois da primeira tentativa de captura do bicho o gambá resolveu subir na grade da janela e lá acabou acuado. Um dos soldados o agarrou pelo rabo ao mesmo tempo em que segurou seu pescoço. Não foi fácil desprender o bicho da grade, mas finalmente o gambá acabou subjugado e preso na jaula, não sem antes dar uma boa mijada na janela e outra na porta de entrada. E lá se foi o gambá com os policiais, deixando sua marca registrada na sala do apartamento. Dª Luci disse que foi uma trabalheira danada conseguir eliminar o cheiro do xixi do gambá, mas finalmente a sala ficou cheirosa. E assim terminou a aventura de um gambá perdido num dos blocos de apartamentos de uma superquadra de Brasilia.

O bom de toda essa conversa com Dª Luci e sua filha foi saber que o pessoal do IBAMA nunca atende os pedidos de resgate de animais silvestres. Quem resolve o assunto, e de uma forma muito profissional e eficiente é a Polícia Ambiental. Basta ligar para o n° 190 e registrar a ocorrência que eles entram em contato com a polícia ambiental que vem resgatar o animal silvestre.

Aproveitei e lá da casa de Dª Luci liguei para o 190 explicando que caiu em meu jardim um filhote que parece ser de gavião. Eles pegaram todos os meus dados e ficaram de vir até minha casa resgatar o passarinho. Vamos aguardar.

Enquanto a polícia florestal não chega minha mãe se diverte cuidando do passarinho. Segundo ela o filhote já está achando que ela é mãe dele, pois é só vê-la que começa a piar pedindo comida. Ele já está conseguindo voar melhor e fica empoleirado em cima do box do banheiro. Quando ela entra no banheiro ele voa para perto dela piando. Ela o alimenta com carne moida que ele devora em pouco tempo.

Para variar minha mãe já está se afeiçoando ao filhote de gavião. Se dependesse dela e não fosse crime criar pássaro silvestre sem autorização ele seria seu mais novo animal de estimação.


Lou Montes

05/11/2009





Hoje é finados, mas a vida pulsa em meu jardim


Ontem, na missa dominical, durante a homilia, o padre criticou a comemoração do dia das bruxas por ser uma festa pagã. Sinceramente não vejo nenhum problema nesse tipo de festa, por mais pagã que seja. Cada comunidade tem suas tradições e estas devem ser respeitadas sejam elas pagas ou católicas.
Deixando a festa das bruxas de lado, hoje é finados. Dia dos mortos.
Minha mãe acabou de me comunicar que o pássaro estranho que caiu no jardim ainda está vivo e parece que recuperando as forças devagar. Hoje já deu conta de engolir a carne moída sem dificuldade. Ela acredita que em dois ou três dias ele já terá condições de voar. Ela também mudou de opinião quanto a raça do pássaro, agora está acreditando tratar-se de um filhote de gavião o que acho mais provável. Ele continua morando provisoriamente no banheiro e já consegue levantar vôo de um lado para outro, mas na maior parte do tempo fico quietinho escondido atrás de uma das boias coloridas.
Quando acordei hoje cedo dei de cara com um bando de periquitos empoleirados na árvore que fica em frente da minha janela. Eles faziam uma grande algazarra enquanto pulavam de um galho para outro. Daí a pouco levantaram vôo, mas dois permaneceram pousados. Ficaram por ali fazendo barulho e acariciando um ao outro até que também resolveram voar para pousar no limoeiro que fica mais distante da janela.
Sairam os periquitos e pousou uma linda sabiá. Meu quintal parece ser o playgraund da passarada. É que minha mãe colaca frutas em pratos que ela pendura nas árvores. Eles adoram. Em pouco tempo devoram uma banana. Também não deixam sobrar nenhum pedaço de mamão, laranja ou maça. Qualquer fruta é bem vinda para eles. Além das frutas ela sempre joga sobras de ração dos pássaros que estão em gaiola. É a diversão da minha mãe. Ela faz uma verdadeira limpa na fruteira da casa que precisa ser constantemente reabastecida.
Todas as manhãs um pombo enorme vem comer no jardim. Ele já sabe que em volta da mixiriqueira encontra sobras de arroz ou ração. Os pardais fazem a festa. É um enorme bando, mas o que enche nossos olhos são os pássaros coloridos que se fartam nos pratos de frutas frescas. Também acho um charme o simpático joão-de-barro que de peito estufado dá três passinhos e uma corridinha pelo chão. O bem-te-vi se julga dono do pedaço e quando está atacado resolve colocar todos os outros passarinhos para correr, ou melhor, voar.

O bocão do passarinho


Hoje pela manhã Helena esteve aqui e mostrou-me alguns textos escritos por Dª Ita, uma senhora de quase 90 anos. Como é bom encontrar alguém tão avançado em idade ainda escrevendo, ainda encontrando poesia nas pequenas coisas e sonhando...
Conversamos um pouco e logo em seguida Helena foi-se embora. Gosto de conversar com ela, de trocar idéias. Nos entendemos muito bem, somos amigas e temos um grande carinho uma pela outra.
Na parte da tarde resolvi dar uma volta pelo jardim. Assim que cheguei perto de um dos canteiros percebi que havia um pássaro voando baixo. Pensei: deve ser um filhote ou é um pássaro ferido.
O passrinho pousou na churrasqueira. Fui até lá, mas assim que ele me viu tornou a voar, dessa vez para um canteiro cheio de plantas altas.
Chamei minha mãe para ver se ela identificava o pássaro. Era um filhote já grande e estranho para mim. Nunca vi de perto um pássaro como ele. Dava para perceber que estava fraco, talvez doente ou ferido, mas não dava para ter certeza.
Ele voou para o lado onde eu estava e caiu perto de mim. Estendi meu casaco para me proteger de uma bicada quando ele resolveu abrir o bico. Recuei assustada. Nunca, em toda minha vida, pude ver de perto um pássaro com uma boca tão grande. Lembrou a boca aberta de uma grande serpente venenosa. Instintivamente recuei e não tive coragem de pegar o passarinho, não com uma abertura de bico daquele tamanho. Fiquei imaginando o estrago que um bico daqueles pode causar na mão de qualquer pessoa.
Minha mãe, mais acostumada com animais, pegou o passarinho, pois era evidente que ele estava sem forças. O bichinho, de bico fechado, é até bonitinho, mas quando abre o bico parece mais um alienígena. É assustador.
Eu, dando uma de entendida no assunto, disse que tendo um bico que se abria daquele tanto ele só podia ser um animal que se alimenta de pequenos roedores. Ela então deu-lhe um pouco de carne moida e em seguida ofereceu ao bichinho algumas pitangas maduras. Ajudado pela minha mãe ele comeu tudo, mesmo com dificuldade.
Como o passarinho não está dando conta de voar direito ela resolveu colocá-lo dentro do box do banheiro da churrasqueira para evitar que um dos gatos da casa acabe com ele na boca. Acho que ele não irá sobreviver, pois está muito fraquinho, mas vou ficar torcendo para estar enganada.
Para não deixar dúvidas quanto ao tamanho da boca aberta do pássaro fiz algumas fotos. Elas também poderão atestar a feiura de um passarinho de bico aberto quando sua boca é enoooorme. Jamais pensei dizer isso de um passarinho, um animalzinho que costuma ser tão bonito e elegante.
Minha mãe acha que é um filhote de anu. Como não conheço esse tipo de passarinho fui tirar mais algumas fotos. Estando ele solto dentro de um box fica fácil fazer alguns cliques, até porque ele está quieto, meio bobo. Continuo acreditando que ele não irá sobreviver, mas se amanhã ele estiver legal irá voar para longe deixando para mim a má impressão de sua bocaaaarra. Nunca imaginei sentir medo de um passarinho.

Esperando a dor passar...

Ontem fiz quimioterapia e nesse exato momento estou sentindo alguns efeitos dela. Um mal estar percorre meu corpo enquanto uma dor que começa no final da coluna se espalha pelo corpo. Sinto náusea, meu corpo reclama, fico inquieta. Sei que não adianta deitar porque fico sem posição quando essa dor começa. O melhor é tentar me distrair enquanto espero o efeito do remédio para dor começar entorpecer meu corpo.
Dor é um negócio muito complicado, tira qualquer um do sério. Essa, especificamente, é sinistra, pois chega sem aviso. Já vem doendo feito louca. Parece que os ossos do corpo inteiro estão sendo comprimidos.
É melhor desviar o pensamento. Fixar na dor é o pior caminho.
Vou falar de sentimentos, outra coisa difícil. A cabeça até sabe o que é melhor, mas o coração insiste em tomar outro caminho.
Emoções...
Cada um tem seu jeito próprio de sentir, de reagir a ela.
Engraçado como a experiência individual pode alterar a forma como uma pessoa reage a uma situação. Não dá mesmo para rotular.
Minha amiga está internada numa clínica psiquiátrica depois que tentou suicídio. Já estava bem e, de repente, teve uma recaída.
Fico aqui pensando nela, torcendo por ela. Uma pessoa jovem e tão bonita, inteligente, excelente profissional e que de repente perde o interesse pela vida. Porquê? Ela não sabe, eu não sei, ninguém sabe. Nem mesmo os profissionais que a acompanham sabem a resposta. De qualquer forma, apesar das recaídas, sei que ela está tentando encontrar o caminho de volta a serenidade e a alegria perdida.
Vou mudar de assunto novamente. Hoje comecei a reler a biografia de Fouché, político da época de Napoleão. Homem ardiloso, que não gostava de mostrar nem seu rosto e muito menos seu jogo político, preferindo trabalhar nos bastidores. Dissimulado, sua ação era quase invisível, mas nada passava despercebido a seu olhar atento. Parecia ter mais do que apenas dois olhos e dois ouvidos. Fouché, como político, era um jogador profissional, um diplomata. Sempre trabalhando na sombra, aproximou-se dos poderosos ganhando influência sobre os acontecimentos, mas sem ser percebido. Ficava, assim, livre de fiscalização e do ódio do povo, bem como protegido da inveja.
Política ainda hoje se faz assim: um candidato promete arranjar para os seus eleitores tudo quanto desejam. Dissimulado, o olhar de um político ardiloso nunca lhe trai a intensão. Sempre atento aos erros dos outros, sabe esperar com paciência o momento certo de atacar um ponto fraco. Sua fidelidade é apenas ao partido mais forte. O ardiloso nunca cai, pois está sempre atrás de um cúmplice para lhe servir de para-raios.
Quantos Fouchés estão agora circulando por nosso Congresso?

A vingança do gato


Luana, uma gata siamesa muito elegante e charmosa, foi adotada pela família quando era apenas uma jovem gata adolescente. Ficamos com muita pena dela que precisou ser doada para que sua dona, uma senhora que ia se tornar avó, pudesse tomar conta da neta que estava para nascer. Achei uma crueldade com a senhora e com a gata e foi isso que motivou a adoção de Lulu.
Como toda siamesa ela tinha os membros e a cauda bem longos, era magra e elegante, tinha os olhos muito azuis e estrábicos e caminhava com muita graça. Era uma lady. Em pouco tempo entrou no primeiro cio e aí começaram os problemas.
Chegava a noite e a gata miava desesperada, doida para sair a procura de um gato qualquer. Era um miado tão agoniado que dava dó, mas também irritava qualquer um que a ouvisse. O que ninguém queria entender era o chamado da natureza para perpetuação da espécie...
É claro que uma noite, driblando a vigilância da casa, Luana escapou na escuridão. Ficou um dia inteiro sumida até que retornou à casa como se nada tivesse acontecido. Algum tempo depois, com a barriga crescendo, ficou claro que ela tinha encontrado o parceiro que procurava.
Nasceram tres gatinhos. Um preto e branco e dois com o colorido do siamês e olhos azuis. A diferença era que os gatos tinham as pernas e a cauda curtas e eram peludos como um angorá. Eu os chamava de sialatas, uma mistura de siamês com vira-latas, pois era impossível deduzir a que raça pertencia o pai.
Doei todos os filhotes e assim que desmamaram comecei a entregá-los para seus novos donos. Um deles precisou ficar mais alguns dias em casa porque sua nova dona havia viajado. Nesse meio tempo decidi mandar castrar a gata para não ouvir mais seus miados sofridos em cada cio e muito menos correr o risco de uma nova ninhada indesejada.
Para meu azar a gata pegou uma infecção na clínica veterinária e acabou transmitindo a bendita para o gatinho que ainda estava aproveitando as últimas mamadas. Resultado, não pude entregar o filhote porque ele precisou fazer tratamento para a infecção e tinha que ir todos os dias com sua mãe tomar o remédio na clínica.
A cura demorou o suficiente para minha mãe cair de amores pelo gatinho e não aceitar que ele fosse doado para qualquer pessoa. Tive que ficar com o gato que acabou batizado com o ridículo nome de Bubu.
Justiça seja feita, o Bubu é um gato lindo. O pelo com a coloração quase branca tem o desenho do siamês só que num cinza bem claro. Os olhos são enormes e de um azul profundo com um risco escuro em volta; parece até que alguém passou delineador. A pontinha do nariz é preta, como se tivesse sido pintada a mão. Suas pernas são curtas e a cauda também e ele é bom fofinho e peludo como um persa ou angorá.
Beleza à parte, o Bubu é um gato muito cínico e vingativo. Se for contrariado ele desconta a raiva fazendo xixi. Pode ser na coleção de CDs, nas portas ou na cortina da sala de jantar. Qualquer lugar serve de alvo para aplacar sua ira. Se eu esquecer a porta do meu quarto aberta pode procurar que encontra uma marca mal cheirosa de sua famosa mijada. Preferencialmente na saia de renda da minha cama que já precisou ser lavada não sei quantas vezes. Até parece que ele sabe que não gosto muito dele.
Quando ouve o barulho da tampa do requeijão sendo aberta o gato começa a miar sem pausa até conseguir um pouco do requeijão para lamber. Ele adora a iguaria. Se quer comer carne moída ou aquelas comidas de gato que vem nas latinhas ele pára em frente da geladeira e dispara a miar até que alguém, já bastante irritado com seus miados, dê o que ele quer para calar sua boca.
Os gatos dormem dentro de casa, mas de vez em quando o Bubu resolve querer sair para o jardim no meio da noite. Ele pára em frente a porta da cozinha, e o que acontece? Começa a miar feito um doido. Se não abrimos a porta para que ele satisfaça sua vontade de sair pode contar, você vai encontrá-lo com a cauda em pé, o bumbum erguido e, com cara de cínico, dando a maior mijada, de preferência na cortina branca da sala de jantar. Já nem fecho mais a cortina, deixo apenas o forro fechado para ficar mais fácil tirar para lavar.
Quando alguém elogia a beleza do Bubu sempre costumo dizer: fique a vontade para adotá-lo. É claro que ninguém se habilitou e ele continua em casa até porque já está velho e seria crueldade mandá-lo embora. Ele é um gato arredio e que não gosta de colo ou carinho. Prefere ficar na dele, deitado numa almofada macia. Sempre que o vejo deitado, com os olhos semicerrados, acho que bolando onde será o alvo de sua próxima mijada certeira.
Lou Montes
26/nov/09

Qualquer lugar serve para se fazer uma oração


Confesso ser uma criatura um tanto cética. Nunca consegui me entregar inteiramente a nenhuma crença religiosa, mas nunca duvidei da existência de Deus. Não sei explicar o porquê, mas sempre acreditei Nele.
Outro dia estava lendo o artigo do Mauro Santayana no Jornal do Brasil que dizia, entre outras coisas, que "... cada um faz de Deus o escudo que lhe convém." Dizia também que "A teologia, tanto nas confissões cristãs, como nas demais manifestações de fé, é uma construção histórica sob influência dos poderes terrenos."
Tenho que concordar com o Mauro. A religião é uma criação humana, por isso as falhas. Em nome de Deus já se cometeu, e ainda se comete, muitas atrocidades, muitas guerras insanas, perseguições e abusos. Isso tudo me deixa confusa, perplexa...
Minha família era católica praticante, frequentei um colégio de freiras, fiz primeira comunhão e durante muito tempo assistir as missas dos domingos era uma obrigação. Lembro bem que durante todo meu curso primário tive aulas de religião. Conheci um Deus bravo, que punia a menor falha. Nunca gostei disso e aos poucos fui me afastando da igreja e parando de rezar aquelas orações decoradas que aprendi na infância.
Realmente deixei de rezar como um autômato, mas nunca deixei de fazê-lo a meu modo. Sempre conversei com Deus de igual para igual agradecendo a bêncão da vida, o sol que brilhava, o verde das matas, a natureza, a família, os amigos e as oportunidades que a vida me oferecia. Sempre O encontrei nas coisas simples que eu gostava e não nas enormes e suntuosas igrejas erigidas em Seu nome; mas depois que conheci o Padre Pedro Bach voltei a frequentar a igreja católica, assistir missas e enxerguei no Pai Nosso e em outras orações uma força que eu nunca havia prestado atenção quando menina.
Hoje pela manhã me convidaram para ir ao encontro de um senhor que costuma rezar pelas pessoas. Fui sem preconceito, afinal acredito que oração, seja lá como for, só pode fazer bem. Era um senhor muito simples que fazia suas orações embaixo de uma árvore com uma sombra generosa. Havia apenas um banco tosco de madeira em cima de um chão de terra batida onde pude ver alguns calangos correndo entre algumas madeiras empilhadas num canto e um cachorro de pelo branco imundo de barro.
Ele me disse que não teve a oportunidade de estudar muito tempo, apenas o suficiente para aprender a ler, mas que, por inspiração de Deus, consegue ler e interpretar as palavras da escritura sagrada.
Usando uma calça escura arregaçada até o joelho, uma camisa branca que ficava pela metade fora da calça, uma sandália surrada e sempre sorrindo ele inicialmente falou um pouco sobre a época conturbada que o mundo está atravessando. Falou de como os homens estão perdidos e distanciados de Deus e de como precisamos rezar para nos reaproximar Dele. Somente assim iremos recuperar a paz no mundo. Em seguida abriu a bíblia ao acaso, leu um pequeno trecho e fez sua interpretação. Com a mão sobre minha cabeça ele fez uma oração.
Um pouco antes de sairmos ele me disse que sendo ele um homem aposentado não precisa mais se preocupar com o trabalho formal. Hoje pode dedicar seus dias ao serviço de Deus levando conforto às pessoas. É o que ele faz, diariamente.
Não pude deixar de pensar: Não há necessidade de trajes especiais ou templos suntuosos. Seja numa pequena capela perdida na meio do mato, numa igreja em frente a uma praça, numa enorme catedral ou embaixo de uma árvore frondosa, qualquer lugar é espaço para se conectar com Deus.