Quem nunca teve vontade de matar o cabeleireiro que fez aquele corte
medonho no seu cabelo que atire a primeira pedra.
O cliente chega naquele salão arrumadinho e é
recebido pela recepcionista sorridente, envergando aquele pretinho básico. Ela
confere seu nome na lista de clientes do dia, oferece uma água ou cafezinho e
pede para você aguardar um pouco. Você lê todas as revistas de fofocas velhas
que estão no cesto e finalmente é chamado para lavar os cabelos e em seguida vai
para a cadeira onde é recebido por sua majestade o cabeleireiro.
A criatura olha com desdém para seu cabelo
molhado, pergunta se você tem alguma preferência para o corte e então pega uma
tesoura comprada há anos e que funciona perfeitamente bem até aquele dia e
começa a fazer o corte. Corta daqui, corta dali e poucos minutos depois diz que
está tudo pronto, pega um espelho e mostra como ficou o corte na parte de trás.
Quando você olha para o espelho e vê sua imagem
refletida de frente e de costas custa a acreditar na cagada que o sujeito
acabou de fazer com o seu lindo cabelo. Você chega a pensar que foi de
propósito, e que o sujeito deve odiar cabelos femininos. O infeliz ficou horas
fazendo um corte masculino e não gastou mais do que alguns minutos para detonar
um cabelo que você cuida com todo amor e carinho há anos. O pior de tudo é que
não adianta gritar ou fazer escândalo porque suas lindas madeixas estão
espalhadas pelo chão e não tem volta.
Você respira fundo, conta até mil para acalmar e
vai pagar a conta. É nesta hora que sua vontade de matar o sujeito cresce
exponencialmente. A conta é um verdadeiro absurdo, um assalto. O corte que destruiu
seu cabelo é caríssimo e você não tem como se recusar a pagar pela porcaria de
serviço que aquele cabeleireiro acabou de fazer em sua cabeça. Alguém já parou
para pensar no lucro que o sujeito tem para fazer um corte de cabelo? O
profissional usa apenas uma tesoura afiada e mais nada.
Já passei por este tipo de raiva algumas vezes e
da última, quando o sujeito destruiu meus cabelos e precisei cortar curtinho em
outro salão para ver se minimizava o estrago, decidi que aquela seria a última
vez que eu iria pagar caro para cortar meus cabelos (ou melhor: estragar meus
cabelos).
Por causa deste tipo de atitude e por achar extorsivos
os preços praticados pelos salões de cabeleireiros eu desisti de cortar meu
cabelo em salões e agora só corto em barbearia. Isto mesmo, em barbearia,
daquelas bem masculinas e sem o menor glamour. A que eu frequento é de uma simplicidade
franciscana: são três cadeiras antigas, o espelho, uma cadeira para lavar a
cabeça, um sofá para lá de antigo e nada mais. Os três profissionais que
atendem na barbearia já passaram dos sessenta e são muito simpáticos e
atenciosos com todos os clientes, seja homem ou mulher. Eles atendem sem a
menor pressa e fazem o corte com todo cuidado e capricho e o melhor, cobram um
preço justo.
Resolvi manter o cabelo curtinho desde o último
desastre com o corte há mais ou menos dois anos. O Sr. João capricha no cuidado
e fica mais de quarenta minutos cortando, aparando e ajeitando meus fios agora
brancos e rebeldes. Sempre conversamos enquanto ele faz o corte e ele comentou hoje comigo o cuidado que precisa ter para domar os redemoinhos que tenho na cabeça,
para não deixar meu cabelo espetado.
Hoje quando levantei da cadeira para sair da
barbearia notei que pelo menos uns cinco homens de diferentes idades aguardavam
ser atendidos. Eu era a única mulher no pedaço.