Nascimento e morte de um gato de estimação

Era manhã de um dia qualquer no ano  de 1983, quando um garoto desconhecido apareceu com uma caixa de papelão bem funda, cheia de filhotes de gatos. Como ninguém topou adotá-los ele não teve dúvidas, abandonou a caixa com os gatinhos na entrada da portaria do bloco de apartamentos em que eu e  minha família morávamos.
Os gatinhos começaram a sair da caixa  tão logo acordaram de um profundo sono, para começarem a circular embaixo dos pilotis do bloco e pelo jardim. Era filhote espalhado por todos os cantos até serem encontrados por garotos malvados que saíram matando sem dó nem piedade cada um deles.
Minha mãe ouvindo um miado insistente, e sabendo da carnificina que haviam cometido com os filhotes, desceu até a portaria e encontrou um gatinho feio e magrela que havia sobrado no fundo da caixa. Pelo jeito ele era mais dorminhoco e lerdo que os irmãos, sua sorte.
O gato sortudo era bem pretinho com listras cinza-escuro ao longo do corpo, olhos redondos muito grandes e bem amarelos e uma cauda fininha como um barbante. Era feio de dar dó, mas foi amor a primeira vista, e amor não se explica. Ela o adotou na hora, apaixonada que sempre foi por animais.
Quando vi que não havia mais o que fazer e que o gato iria mesmo fazer parte da família, pois o mesmo já havia até recebido um nome,  minha exigência foi que pelo menos dessem um banho naquele bicho feio e magricela. Rapidinho esquentaram  uma água para o primeiro e único banho que o Nino tomou em casa, berrando feito um louco durante toda a operação. O segundo passo foi levá-lo ao veterinário para as vacinas necessárias.
Foi preciso pouquissimo tempo para que o Nino se tornasse  um filhote bonito, bem cuidado e muito brincalhão. Era virou a alegria da casa e vivia no colo da minha mãe que o mimava de todas as formas. Cresceu rápido como qualquer gato, e parecia uma pantera negra quando dormia espichado no sofá da sala, seu cantinho predileto.
Quando mudamos do apartamento para uma casa com quintal e um grande  jardim ele ficou muito assustado. No primeiro dia, enquanto os móveis eram colocados no lugar, ele se enfiou num armário e ficou lá escondido o dia inteiro, mas no dia seguinte saiu devagar para o quintal, e muito desconfiado foi aos poucos explorando cada novidade que encontrava e não demorou muito para fugir para o quintal vizinho que estava vazio e era separado do nosso apenas por uma cerca de arame farpado. Minha irmã ficou nervosa e com medo que o gato desaparecesse e foi  rápido pegá-lo de volta.
O Nino aproveitou muito sua juventude, correndo pelos lotes vazios e sem muros  no condomínio que morávamos. Rapidinho aprendeu a caçar e vivia pegando passarinhos distraídos e calangos que trazia e deixava na porta da cozinha, para desespero da minha mãe e da Suzi.
O condomínio começou a crescer e muitas casas foram construidas com muros, mas mesmo assim, enquanto teve energia,  Nino corria pelos quintais vizinhos. Para identificá-lo, evitando que alguém o ferisse, nós colocamos uma coleira em seu pescoço. Todos conheciam o Nino e o protegiam. Nunca ninguém o machucou. Ele era um gato que todos gostavam pois, além de muito bonito era também muito carinhoso.
Mas o tempo passou e a idade cobrou seu preço.  Nino envelheceu e não conseguia mais pular o muro. Devagar foi perdendo a visão, emagrecendo, ficando cheio de dores e dificuldades. Era triste olhar sua decadência. O tempo é cruel também para os bichos.
Hoje, mais de dezoito anos depois que foi adotado, o Nino acordou e mal conseguiu se levantar. Minha irmã, muito a contragosto, admitiu que ele estava morrendo. Minha mãe ainda tentou alimentá-lo, mas ele estava muito fraquinho e deitou novamente na almofada que sempre dormia. Minha irmã chorou um choro sentido. Era alguém da família que estava partindo. Eu também acabei chorando. O Nino miou pela última vez e fechou os grandes olhos amarelos para sempre.
6 Responses
  1. Issia Montes Says:

    não sei pra que fui ler isso, só pra chorar...


  2. Lou Says:

    Nós corremos o risco de chorar um pouco quando nos deixamos cativar.
    bjs


  3. Carol Says:

    Nino é eterno.


  4. Anônimo Says:

    tb tenho um gatinho com uma historia mt parecida. espero que ainda dure alguns anos.


  5. Anônimo Says:

    Muito triste, lembrei do meu Nino que também nos deixou e faz muita falta.


  6. Lou Says:

    É sempre muito triste perder um animal de estimação. Aliás, perdas são sempre muito difíceis.


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Obrigada pelo comentário. bjs Lou