Uma experiência difícil

             - Aguarde sentada naquele banco que vou buscar um funcionário que fale português para conversar com sua amiga.
            Maria e Fátima tinham acabado de chegar ao aeroporto de Heathrow em Londres e foram juntas para o guichê de imigração. Maria que tinha vários carimbos no passaporte e Visto dos EUA não teve nenhum problema e foi admitida para permanência de seis meses na cidade, mas o guarda da imigração resolveu criar caso com Fátima porque o passaporte dela não tinha nenhum carimbo e ela estava chegando à cidade para estudar por seis meses e não falava uma palavra sequer em inglês.
            A conversa não acabava mais e de longe Maria só conseguia ver a amiga gesticular e responder a várias perguntas, não dava para deduzir e muito menos escutar o que eles tanto falavam. Ela já estava ficando aflita, com medo de Fátima ser deportada, quando finalmente a imigração resolveu carimbar o passaporte. Mais do que depressa as duas pegaram as malas na esteira e quando finalmente alcançaram o saguão encontraram outro problema: o amigo que ficou de buscá-las no aeroporto não estava aguardando no local combinado.
            Elas estavam cansadas da longa viagem e bastante estressadas com o episódio na imigração. Tentaram falar pelo celular, mas a ligação caía na caixa postal. Por onde andaria Vitor? Resolveram sentar e aguardar um pouco mais.
            O tempo passava e nada de Vitor chegar. As duas já estavam na fila do taxi quando ouviram uma voz conhecida gritando seus nomes, era o Vitor que vinha correndo ao encontro delas. Ele sorria enquanto se desculpava pelo atraso. Os três se abraçaram e saíram juntos do aeroporto. Optaram pelo metrô, já que iriam descer em Piccadilly Circus, onde ele trabalhava.
            A viagem até o centro de Londres foi longa, quase uma hora no metrô lotado. Quando chegaram na estação de Piccadilly desembarcaram e para desespero dos três só havia uma escada que levava para a saída. O jeito foi respirar fundo e arrastar as pesadas malas escada acima. Quando finalmente alcançaram a rua uma rajada de vento gelado os recebeu, mas mesmo assim foi um alívio sentir que finalmente haviam chegado ao destino.
            Foram direto para o hotel que ficava quase em frente a saída do metrô e onde passariam a noite. Estavam exaustas pela viagem longa e pelo estresse na imigração. Só queriam descansar para apagar da memória as lembranças ruins da chegada à cidade. No dia seguinte sairiam com calma para conhecer Londres.
            O domingo amanheceu frio, nem parecia verão. Foi preciso usar botas, um agasalho e cachecol quentinho para se proteger do frio que parecia querer congelar até os ossos. – É assim o verão na Europa? Fátima perguntou assustada, já que detestava invernos gelados. Vitor sorriu e disse que em Londres o tempo era meio doido. Era muito comum a cidade exibir todas as estações do ano num mesmo dia.
            Como estavam em Piccadilly foram caminhando a pé até o Palácio de Buckingham, primeiro ponto turístico que resolveram conhecer. A longa avenida de acesso ao palácio era ornamentada com árvores antigas e frondosas que deixavam uma sombra gelada e escura desenhada no chão. Fátima levantou a gola do casaco para ver se esquentava um pouco mais. Ela andava encolhida, de cabeça baixa e com as mãos protegidas no bolso do casaco. Sentia tanto frio que nem conseguiu reparar direito nos canteiros em frente ao palácio que ainda exibiam flores coloridas. Uma multidão de turistas aguardava em frente aos portões altos.
            Assistiram a troca da guarda e em seguida foram conhecer o Parlamento e o famoso Big Ben. Fátima estava impressionada com tudo o que via, era sua primeira viagem a Europa. A única coisa que tirava um pouco do prazer no passeio era o vento frio que não parava de soprar. O Palácio de Westminster ou Casas do Parlamento, que abriga a Câmara dos Lordes e a Câmara dos Comuns, fica numa das margens do Rio Tamisa.
            Assim que viu o prédio do Parlamento Fátima exclamou excitada: - a arquitetura da fachada é gótica! Aprendi isto em minha aula de decoração, mas é a primeira vez que vejo um prédio assim. – É lindo!
 O famoso relógio Big Ben fica numa das torres que mede 96 metros e é conhecida como Torre do Relógio. Depois do almoço as amigas resolveram voltar para o hotel e não saíram mais. No dia seguinte precisavam sair para conhecer a escola onde iriam estudar e iriam também para a casa da família que iria hospedá-las durante o período que ficariam na cidade.
            Na segunda-feira foram conhecer primeiro a casa onde iriam morar e levaram o maior susto. A dona da casa informou que havia cancelado a reserva da hospedagem e que a escola sabia do cancelamento. Maria e Fátima ficaram assustadas, pois a escola não havia informado nada sobre o cancelamento da hospedagem. Ainda bem que Vitor estava com elas e pode acompanhá-las até a escola para tentar resolver o problema.
            A escola ofereceu outra opção de hospedagem e lá se foram os três para o novo endereço, mas outro problema os aguardava: o dono da casa estava furioso porque um aluno da escola havia quebrado algumas coisas em sua casa e saído sem pagar pelo prejuízo. Ele chacoalhava um chaveiro com as chaves da casa enquanto conversava com Vitor e dizia que só receberia as duas novas alunas se elas pagassem adiantado a quantia de cento e cinquenta libras para cobrir os prejuízos causados pelo outro estudante.
            Maria e Fátima se recusaram a pagar pelo prejuízo e voltaram desoladas para o hotel onde estavam hospedadas. Já era muito tarde, estavam cansadas e furiosas com a escola, pois pagaram adiantado um mês de hospedagem quando fizeram a matrícula, antes de saírem de suas casas, e agora estavam sem lugar para morar em Londres e não podiam ficar muito tempo pagando pela diária do hotel. Elas precisavam encontrar um lugar para morar, pois estavam se sentindo como duas sem teto em Londres. Parecia que tudo estava dando errado para as amigas, desde a chegada ao aeroporto. Era melhor dormir e esfriar a cabeça.
            Vitor trabalhava no hotel onde Maria e Fátima estavam hospedadas, e então conversou com sua gerente para saber se era possível elas ficarem morando no mesmo alojamento dos funcionários do hotel que ainda tinha alguns quartos disponíveis. Ele explicou a situação das amigas e a gerente, sensível ao problema, resolveu alugar um dos quartos. Ela também sugeriu que ambas tentassem uma vaga para trabalhar meio período no restaurante do hotel, já que eram estudantes e podiam trabalhar legalmente.
            Não podia ter acontecido nada melhor. Os ventos pareciam estar começando a soprar em favor das amigas que além de conseguirem um quarto para morar no centro de Londres, ainda podiam trabalhar pela manhã e estudar no período da tarde. Era um arranjo perfeito. Elas pegaram suas malas e fizeram a mudança para o alojamento no mesmo dia, e em seguida foram até a escola cobrar de volta o pagamento referente a um mês de hospedagem em casa de família.
            A primeira semana chegou ao fim e Fátima não parecia nada feliz. Ela trabalhava no hotel pela manhã e frequentava a escola de inglês na parte da tarde. Chegava em casa abatida comentando as histórias de vida que ouvia dos colegas que frequentavam a mesma escola. Eram histórias de pessoas pobres que foram morar em Londres e que viviam no maior sufoco. Eles precisavam estudar para manter o visto de estudantes e assim poder continuar trabalhando legalmente, moravam em bairros distantes do centro e trabalhavam muito para se manter e também poder mandar dinheiro para as famílias. Era uma vida muito dura e difícil.
            Fátima não conseguia se adaptar e sentia muita falta de sua casa e sua família que havia ficado para trás. Além da dificuldade com a língua, o que atrapalhava a comunicação no trabalho, o frio, em pleno verão, piorava ainda mais as coisas. Ela só queria dormir e se recusava sair para conhecer a cidade. Saía da cama apenas para trabalhar e ir para o curso de inglês. Na metade da segunda semana ela decidiu que não iria mais ficar, queria voltar para casa. Pediu ajuda a Vitor e foram marcar a passagem de volta. No final da segunda semana Fátima embarcou de volta para casa sem ter conhecido Londres.
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Cadê meu prontuário da radioterapia que fiz no Hospital Santa Lúcia em 1998?

     Meu último PET evidenciou um aumento de 150% na atividade metabólica do tumor no esterno, em apenas 4 meses. Como osso é pouco vascularizado e o tumor no esterno não está respondendo muito bem a quimioterapia que venho fazendo, meu oncologista me encaminhou para o Hospital Santa Lúcia para fazer radioterapia.
     Gostei muito do Dr. André, médico radioterapeuta que me atendeu. Ele disse que preciso fazer 10 sessões, mas para isto é necessário que o hospital localize o prontuário da primeira radioterapia que fiz em 1998, quando fiz a quadrantectomia por causa de um câncer de mama primário.
     Até aí tudo bem, mas pasmem:  minha consulta foi no dia 18 de junho e até hoje o hospital não encontrou meu prontuário antigo. Na última segunda-feira liguei para saber notícias sobre meu tratamento e a pessoa que me atendeu informou que até então a empresa contratada para guardar os prontuários antigos não tinha conseguido localizar o meu prontuário, e que por isto eu não poderia iniciar o tratamento.
     Ontem ligaram do hospital informando que o prontuário ainda não foi localizado, mas pediram que eu fosse hoje às 14h fazer a tomografia, para ir adiantando os procedimentos para iniciar a rádio.
     Acho um absurdo e um descaso sem tamanho que um paciente oncológico, de um hospital privado, tenha um tratamento adiado por falta de organização e controle na guarda de prontuários antigos. Isto é uma vergonha, uma falta de respeito com os pacientes que confiaram seus tratamentos a um determinado hospital. 
     O tumor no esterno, enquanto aguardo que alguém de boa vontade encontre o meu prontuário, continua fazendo a festa e se multiplicando feito um doido. Queria que este tumor sumisse do meu esterno e passasse a crescer no peito de algum daqueles irresponsáveis que enfiaram meu prontuário sabe-se lá onde,  para ver como é desesperador ficar aguardando e dependendo disto para iniciar um tratamento. É horrível conviver com um monstro alienígena corroendo você por dentro e você simplesmente não tem o que fazer e ainda por cima precisar contar com a boa vontade de outras pessoas.


Graduação de uma Chef que já sabia cozinhar

          Ainda me lembro como se fosse ontem: ela nasceu chorando forte e foi uma criança sapeca, que não parava quieta um minuto sequer. Não podia ver uma porta aberta que escapava correndo para a casa do outro lado da rua onde era sempre recebida com carinho pela D. Neusa, uma vizinha que a chamava de “Pinguinho do I” porque era muito magrinha e miúda.
            Aprontava tantas que volta e meia machucava feio. Uma vez levou um tombo na rua e caiu de cara no chão. O queixo magrinho bateu na quina da calçada fez um rombo feio e um pedacinho da carne caiu no paralelepípedo encharcado pelo sangue rubro que saía do corte. A pequena pegou o pedacinho de seu queixo e berrando a pleno pulmões entrou correndo em casa espalhando gotas de sangue pelo chão. Foi levada para o hospital e levou alguns pontos que deixaram uma cicatriz que ela carrega até hoje.
            De outra feita ela subiu na mureta da varanda da casa vizinha e caiu estatelada no chão quase arrancando um pedaço da língua que ficou presa apenas por uma pele fininha. Foi outro berreiro, sangue escorrendo e outra visita ao hospital. A pequena levou um monte de pontos na língua, mas nem assim deixou de aprontar suas artes.
            Ficou órfã de pai aos 7 anos e como era muito fujona sua mãe a carregava para o trabalho, no colégio das freiras. A Irmã Geralda, uma freira boazinha e carinhosa que trabalhava na cozinha, mandou fazer dois aventais xadrezinhos para a pequena e a colocava para ajudá-la na cozinha e assim dar sossego para a mãe trabalhar em paz. Sua primeira tarefa na grande cozinha foi catar arroz e feijão, mas em pouco tempo a menina estava ajudando a Irmã Geralda fazer biscoitinhos caseiros. Foi assim que a garotinha levada tomou gosto pela culinária, seus cheiros, sua alquimia. Ela adorava fazer coisinhas e se divertia em cima de um banquinho para alcançar o enorme fogão e mexer as panelas que ferviam com comidas cheirosas e muito gostosas.
          Naquela ocasião a menina começou a ter um sonho recorrente: ela sonhava com uma cozinheira negra, muito gorda, mexendo uma enorme panela que fervia no fogo. Ela tinha a sensação de que aquela mulher era ela mesma, embora não entendesse como podia ser criança e se enxergar numa mulher velha e gorda. A imagem daquela cozinheira que aparecia em seus sonhos mexendo a panela a perseguiu muito de perto, durante boa parte de sua infância.
          O tempo passava e a cada dia a menina tomava mais gosto pela culinária e sentia um prazer enorme em experimentar receitas e revelar sabores. Ela cresceu e todos que a conheciam de perto experimentavam seus pratos deliciosos e muitos a incentivavam explorar aquele dom de extrair sabores sutis, que enchiam a língua e despertavam o paladar dos amigos.
          Anos se passaram, mas só agora aquela garotinha levada da breca, que começou ajudando a catar arroz e feijão na cozinha de um colégio de freiras no interior de Minas Gerais, conseguiu se formar em gastronomia pelo IESB de Brasíla. Ela precisou primeiro vencer seus medos, enfrentar seus fantasmas, lutar contra a insegurança e a baixa autoestima para ter coragem de se inscrever no vestibular. Ela demorou, mas finalmente conseguiu acreditar que era capaz de realizar qualquer sonho pessoal e acabou de se graduar.

Erasmo - Suzi - Andre - Aline
(Grupo do Degust 2013 do IESB)

          Parabéns Suzi, estou muito orgulhosa de você minha irmã. Tenho certeza absoluta que tanto eu quanto todas as pessoas que convivem ao seu lado e admiram a pessoa generosa e talentosa que você é torcem pelo seu sucesso como chef.  Aliás, quem a conhece e já teve a oportunidade de provar seu tempero especial  sabe que você é uma grande chef há muito tempo, que agora conquistou o título. A faculdade serviu apenas para aprimorar seu dom e o seu talento.

As bodas de Dolores

            - Só porque sou morena cor de canela e tenho os cabelos negros e cacheados não posso ser freira?
            - É, passou de branco é preto, e mulher preta não pode ser freira nesta Congregação.
            Esse diálogo carregado de preconceito seria motivo de processo nos dias de hoje, mas nos idos dos anos cinquenta era perfeitamente normal. Alguém com mais de sessenta anos tem lembrança de ter conhecido na juventude alguma freira negra? Duvido.
            E a jovem morena cor de canela perdeu a ilusão de que algum dia iria passar pelo ritual dos votos perpétuos para se tornar freira e esposa de Cristo. Apesar de a congregação tê-la rejeitado para ser freira ela continuou morando e trabalhando no convento, pois já vivia lá há muitos anos e aquela era a única vida que conhecia.
            Numa bela manhã de sol Dolores carregava de volta para a cozinha do convento uma bandeja com delicadas xícaras de porcelana e um bule com um pouco de café negro e cheiroso. Uma freira já avançada em idade se aproximou e com voz forte e decidida disse-lhe de sopetão: - O Sr. Heitor, que trabalha em nosso colégio, é viúvo e quer se casar com você.
            Dolores levou tanto susto com a notícia que deixou cair a bandeja espalhando cacos de louça e café pelo chão. Olhou surpresa para a freira que continuava em pé na sua frente e disse quase num sussurro: - mas ele é um velho. Não quero me casar com um homem velho e que eu mal conheço. Eu nunca sequer conversei com o Sr. Heitor, como é que ele quer se casar comigo?
            A freira retrucou encerrando o assunto: - O Sr. Heitor é um homem bom, sério, é viúvo e quer se casar com você. Não seja tola. Aproveite a chance de ter um marido que cuidará de você, lhe dará uma casa e filhos. – Eu nem quero ter filhos. Sempre quis ser esposa de Cristo, e nunca pensei em me casar, ainda mais com um homem velho...
            A pressão para que Dolores aceitasse o pedido de casamento foi enorme. Todo dia era a mesma ladainha: você precisa aceitar o pedido de casamento. Não houve paquera e muito menos namoro. Dolores não teve escolha e poucas semanas depois dessa conversa ela e Heitor embarcaram de ônibus para São Paulo e lá pegaram outro ônibus para uma cidadezinha no interior do estado. Era lá que o pai e os irmãos de Dolores moravam, e era lá aonde eles iriam se casar. Mal trocaram algumas poucas palavras durante o trajeto da viagem que começara no Rio de Janeiro, o coração dela estava muito apertado. Dolores sentia medo do futuro que haviam escolhido para ela.
            A família aguardava o casal na pracinha da cidade. Havia um misto de curiosidade e surpresa com a chegada dos noivos, pois ninguém acreditava que Dolores iria se casar algum dia.  Desde que ela fora embora para o Rio de Janeiro seu desejo era o de se tornar freira, e ser esposa de Cristo.
            Heitor era um homem alto e bonito. Sua pele bronzeada pelo sol tropical destacava os olhos verdes num rosto de traços fortes e marcantes. Ele não aparentava ter quase 60 anos.  Diferente de Dolores, estava tão feliz com as bodas que até mandou preparar na padaria da cidade um bolo enfeitado com uma pombinha branca para recepcionar os amigos e familares da noiva. Como religiosa que era, Dolores escolheu o mês de maio, mês de Maria, para se casar e entrou caminhando séria e solene pela nave da pequena Igreja do interior. Ela não estava feliz dentro do vestido de noiva simples e elegante, estava assustada e deprimida. O casamento não fazia parte dos seus planos de vida, mas a pressão havia sido tão grande que ela acabou por concordar em se casar com um homem velho que tinha idade para ser seu pai.
            Heitor a aguardava sorridente no altar, ele usava um terno preto com finas listras brancas que o fazia parecer ainda mais alto do que era realmente. A cerimônia foi breve e no dia seguinte o casal tomou o ônibus de volta ao Rio de Janeiro. Em março do ano seguinte nasceu a primeira filha do casal.
            Eles tiveram três filhas e foram felizes juntos, apesar da diferença de idade. Pouco depois de completarem onze anos de casados Dolores ficou viúva e precisou criar suas filhas sozinha e com muitas dificuldades, como ela havia previsto desde o momento em que disse o SIM no altar, na cerimônia do seu casamento.
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O grito dos brasileiros

          A corja de parlamentares corruptos que ocupa o nosso Congresso e a turma do PT não contavam com a revolta do povo. Eles estavam muito seguros de que com um pouco mais de circo e futebol iriam calar a população brasileira mais uma vez. Estavam enganados. Desta vez o jogo deles não deu certo e o grito de revolta que estava preso na garganta dos jovens explodiu por todo o Brasil e está ganhando mais adeptos a cada dia.
           O brasileiro pacífico cansou de ser o espectador silencioso da roubalheira generalizada perpetrada por políticos desonestos e corruptos, dos desmandos dos parlamentares com ficha suja que ocupam posições de destaque no Congresso, das regalias absurdas em que estes mesmos parlamentares se esbaldam sem pudor.
O brasileiro pacífico cansou de implorar por salários justos, boas escolas, hospitais equipados, médicos comprometidos, professores bem remunerados, segurança, dignidade. O brasileiro pacífico cansou de pagar impostos extorsivos sem contrapartida nenhuma. O brasileiro pacífico chegou ao seu limite de tolerância e não quer mais ser omisso.
       Os protestos tiveram início com o anúncio do aumento nas tarifas cobradas pelo transporte público precário e de péssima qualidade, e evoluíram para outras reivindicações necessárias e legítimas.
          A população esclarecida, aquela que não se contenta com o pão e o circo que o governo petista oferece, aquela que é contrária ao bolsa família e outros benefícios que servem apenas para manter a população pobre cada vez mais dependente do governo, está nas ruas exigindo o fim das políticas equivocadas, o fim da corrupção, o fim da impunidade, o fim da violência e a aplicação justa e correta do dinheiro público, dinheiro que vem dos nossos impostos.
           O grito do povo nas ruas não é apenas por causa do aumento de 0,20 centavos no valor das passagens dos transportes públicos velhos e sucateados. O povo brasileiro quer ser ouvido, quer ser respeitado, quer ter dignidade. O povo brasileiro não aceita mais esta democracia de araque, de faz de conta. O povo quer a democracia plena.
Não estamos interessados em estádios espetaculares enquanto faltam hospitais equipados em todo o país. Não estamos interessados em ganhar a Copa do Mundo enquanto faltam escolas e professores preparados e bem remunerados em todo o Brasil. Nada disto pode ser prioritário se nos falta segurança e se a violência retira de todos nós o direito de sair despreocupados pelas ruas. Aliás, do jeito que as coisas estão não nos sentimos seguros nem mesmo dentro de nossas casas ou nos locais de nossos trabalhos.
Senhores políticos eleitos “democraticamente” pelo povo estamos protestando nas ruas para exigir também a rejeição da ridícula e absurda proposta da “cura gay” que serve apenas para evidenciar o preconceito contra minorias, estamos exigindo a rejeição da PEC 37 que limita a atuação do Ministério Público nas investigações criminais. A população esclarecida exige que a independência do Ministério Público seja garantida. Estamos exigindo uma política comprometida com o social, com o povo. Não aceitamos mais corrupção, impunidade, violência e todas as mazelas que comprometem o real desenvolvimento do nosso país.
         Nossas reivindicações são legítimas, queremos ser ouvidos. Cuidado com as próximas eleições, e não se esqueçam de que, de acordo com nossa Constituição “O PODER EMANA DO POVO” e não o contrário.

Radioterapia para tratar tumor resistente no esterno

     Hoje fui ao Hospital Santa Lúcia para a consulta com o Dr. André Rêgo, o médico que irá definir a radioterapia que irei fazer para acabar de vez com o tumor no esterno que está resistente a quimioterapia. Ele me explicou que o tumor ósseo costuma não responder tão bem a quimioterapia. Tanto é verdade que estou livre de quase todas as metástases que já apareceram pelo meu corpo, mas as metástases ósseas continuam atrapalhando minha vida. A pior delas é no esterno, pois incomoda bastante.
     Gostei do Dr. André. Ele é aquele tipo de médico que passa segurança ao paciente e a certeza de que sabe muito bem o que está fazendo. Ele olha o paciente nos olhos e não tem pressa em acabar logo com a consulta. Gostei. Acho que estou nas mãos da pessoa certa para cuidar do meu caso.
     Em nossa conversa eu disse que não tinha boas recordações da radioterapia que precisei fazer em 1998, quando tive o câncer primário de mama e precisei fazer uma quadrantectomia. Ele me tranquilizou dizendo que as novas máquinas nem de longe lembram aquelas que usei da primeira vez e que hoje os efeitos colaterais, quando acontecem, são mínimos. Bom saber disto.
     Vou precisar de 10 aplicações de radioterapia no esterno e como elas são diárias, de segunda a sexta-feira, em duas semanas estarei livre do tratamento e do tumor resistente. 
     Agora vou precisar fazer a tomografia de tórax para fazer as marcações no local certo. Acho que o início do tratamento será apenas na primeira semana de julho. O bom disto tudo é saber que em outubro poderei viajar tranquila e curtir minhas merecidas férias. Já estou em contagem regressiva. Fazer radioterapia neste intervalo será apenas um detalhe.






Preparando mais uma pausa para viajar

     Hoje tive consulta com meu oncologista, Dr. Fernando Maluf. Como eu esperava, de acordo com o resultado do PET, o dr. Fernando achou que  o câncer está respondendo bem ao tratamento, com exceção de um dos tumores no esterno. Ele optou em manter a quimioterapia que venho fazendo, mas acrescentou a radioterapia para atacar especificamente este tumor resistente no esterno. 
     Meu estado geral é bom e o exame de sangue com os marcadores tumorais está ótimo. Acredito que a radioterapia irá resolver o problema. O que realmente quero é ficar bem e levar uma vida o mais próxima do normal possível. 
     Aproveitei para falar com meu médico que vou sair de férias em outubro. Tenho mais de três meses pela frente para me preparar para a viagem. Ele concordou que o passeio é uma boa idéia, pois para mim viajar é muito terapêutico e funciona melhor do que qualquer quimioterapia.      
    Gosto de planejar minhas viagens com bastante antecedência e com o aval do meu médico, é lógico. Juntos criamos estratégias para que eu possa aproveitar as férias sem prejudicar meu tratamento. Meu lema é o seguinte: Eu me trato para viver e não vivo apenas para me tratar. A vida fica muito sem graça quando não nos damos o direito de fazer algo prazeroso.
     Costumo viajar nos intervalos das quimioterapias. Posso até atrasar um pouco a aplicação de uma das quimioterapias, mas não o bastante para comprometer o tratamento. De qualquer forma carrego comigo a quimioterapia oral que já dá um suporte importante. Levo também um relatório do meu oncologista e todas as receitas dos remédios que uso regularmente.
     Para me resguardar também levo na bagagem um antibiótico para uma emergência, e remédios que possam ser necessários para dor ou uma gripe. Em resumo, levo uma farmácia de emergência comigo, além do seguro médico, é claro, pois não viajo sem isto. Aliás, ninguém deveria viajar sem um bom seguro de saúde.
     Também costumo visitar meu angiologista antes de viajar para me prevenir contra o risco de uma trombose durante vôos de longa duração. Além de usar meias de compressão uso um remédio antes e durante a viagem. Durante o vôo costumo levantar algumas vezes para exercitar as pernas e bebo muita água para evitar desidratar. São pequenos cuidados que podem evitar problemas mais sérios.
     Minha próxima aventura pelo mundo será na Bretanha, no oeste da França, terra de muitas lendas e histórias.

Lembranças de uma infância feliz

       Os brinquedos que povoaram a imaginação da minha filha e de seus amiguinhos de infância ficaram guardados em grandes caixas durante muitos anos. Não eram mais importantes e ela quase se esquecera de suas bonecas favoritas, do palhacinho azul e rosa que ela adorava, do cavalo branco com crinas longas e douradas salpicadas de estrelas coloridas, a coleção de suas bonecas Barbie, seus bichinhos de pelúcia e o mobiliário de sua casinha de bonecas.


            Um dia destes resolvi abrir as caixas e tirei uma das bonecas. Ela estava cheirando a guardado, sua roupinha estava suja e toda desarrumada. Peguei a boneca, tirei sua roupa, coloquei de molho numa bacia e entreguei a boneca para minha mãe que lhe deu um banho e lavou e secou seus cabelos. Assim que a roupinha secou no varal minha mãe fez os reparos necessários e vestiu novamente a boneca que ficou com aparência de nova em folha. Peguei a boneca e guardei numa estante de bonecas, que tem as portas de vidro.


            Animada com o resultado peguei mais duas bonecas e eu e minha mãe repetimos a operação de lavar as bonecas e suas roupinhas e vesti-las novamente. Mais duas bonecas foram parar no armário e então resolvemos fazer o mesmo com as outras bonecas e alguns dos brinquedos favoritos. Minha mãe que gosta de costurar confeccionou algumas roupinhas novas para as bonecas que estavam com as roupas muito estragadas. Ficou tudo novo e muito lindo e agora a estante está cheia de bonecas e brinquedos que um dia fizeram parte da infância da Bárbara.


            Durante a operação de lavagem dos brinquedos o palhacinho azul e rosa ficou pendurado no varal para secar. Quando a Bárbara chegou em casa e deu de cara com seu palhacinho predileto da infância ela fez a maior festa. Parecia até que tinha, por alguns instantes, voltado a ser criança novamente. Ela abraçou o palhacinho como fazia quando pequena e ficou muito feliz ao revê-lo limpinho e cheiroso. Tenho certeza de que foi muito prazerosa aquela volta repentina a uma infância feliz e cheia de boas recordações.


            Acho que estou num momento de nostalgia ou sei lá o quê. A Bárbara foi morar na própria casa e só vem na minha casa de vez em quando. Tenha a impressão de que os brinquedos que um dia foram seus brinquedos prediletos mantêm a energia dela mais próxima de mim. Eles ficam na sala onde fica também o computador que costumo usar e me fazem companhia. Quando olho para eles alguma cena da infância da minha filha me vem a cabeça. Ela foi uma criança feliz e hoje é uma mulher adulta, responsável, equilibrada e de bem com a vida. Ela é uma pessoa feliz. Ela é meu presente de Deus.

Redução da maioridade penal - Você é contra ou a favor?

       Tinha decidido não escrever mais sobre política e muito menos sobre políticos corruptos que infestam nosso Congresso Nacional, mas no último domingo li a notícia do assassinato do professor Herver em plena luz do dia, numa praça próxima de um posto policial e acabei mudando de idéia.
        As notícias sobre o caso dizem que Herver, professor particular de francês, que dava aulas em Brasilia, foi assassinado a pauladas por um menor de 17 anos que ficará, na melhor das hipóteses, internado por 3 anos e depois sairá com a ficha limpa, como se nunca tivesse cometido a menor infração.
         Esta e outras notícias sobre crimes envolvendo a participação de menores são revoltante e incomodam qualquer pessoa de bem. A morte do francês mexeu comigo porque conheci de perto o professor Herver. Ele era um homem educado, trabalhador e muito sério. Morreu espancado por um menor como um bicho peçonhento qualquer. Uma forma cruel de se morrer. Ele não merecia isto, como nenhum outro ser vivo também não merece.
        Já é antiga a discussão sobre a necessidade de se alterar a idade da maioridade penal, tendo em vista o crescente envolvimento de menores em crimes de homicídio, com requintes de crueldade.
      Assisti recentemente a um debate sobre o assunto e alguns políticos se posicionam absolutamente contra, psicólogos também são contrários e até mesmo alguns cidadãos comuns, mas acredito que a maioria esmagadora concorda que a maioridade penal deve ser reduzida. Alguns falam em 16 anos, outros até um pouco menos. A discussão sobre o assunto parece não ter fim, bem como a crueldade destes jovens que não se intimidam em aterrorizar e matar cruelmente qualquer pessoa que cruze seu caminho ou os contrarie.
       O jovem infrator só tem direitos, assim diz a lei. Se ele quer um “tênis ou uma bermuda da hora” basta assaltar e pegar o tênis ou a bermuda na marra. O menor quer dinheiro para comprar droga, é só assaltar e até matar. Agora parece que virou moda atear fogo na vítima que tem pouco dinheiro no bolso.
Esta lei de proteção ao menor tirada das mentes de parlamentares corruptos, que só se preocupam em resguardar seus próprios interesses, já nasceu cheia de defeitos e brechas por onde escoam os direitos do cidadão de bem, aquele que paga um absurdo em impostos e procura ser honesto.
         Meu posicionamento quanto a redução da maioridade penal é contrário. Não vejo nenhuma vantagem em se reduzir a maioridade penal dos atuais 18 anos para 16 anos ou menos. Por outro lado, acho que o menor dos tempos atuais não é mais o menor de alguns anos passados. O menor de hoje é muito mais antenado e sabe muitíssimo bem o que está fazendo. Ele não é nenhuma criança inocente, que não entende a gravidade dos próprios atos.
        Mas que incoerência! Como é que penso assim e sou contra a redução da maioridade penal? Muito simples. Acho que o menor, tenha a idade que tiver, precisa responder por seus atos. O menor precisa ser punido. Ele não pode sair por aí aterrorizando e matando gente inocente apenas porque sabe que a atual legislação o protege.
            Aliás, com a legislação protegendo o menor e com a lei punindo pais que dão algumas palmadas em seus filhos, estes menores estão se sentindo cada dia mais blindados e distanciados dos rigores da lei, e os bandidos adultos se aproveitam desta lei torta. Os menores infratores riem e debocham das autoridades e de suas vítimas porque sabem que a lei os protege incondicionalmente.
         O político de carreira não está preocupado com a carnificina que assola o país. Ele está blindado pelo cargo que ocupa e pelos seguranças que os protegem. Dificilmente um político cairá vítima de bandidos ou de menores infratores; ao contrário, o cidadão comum, aquele que paga impostos extorsivos e que não tem como fugir da violência porque precisa trabalhar, pegar ônibus ou dirigir seu próprio carro está sempre exposto.  Nós, cidadãos, não temos a quem recorrer.
        Acho que precisamos mudar nosso discurso e exigir que o menor, tenha a idade que tiver, passe a responder pelos seus atos. O crime servirá apenas para emancipar este menor e fazê-lo responder pelo ato criminoso.  Baixar a maioridade penal só servirá para que os menores passem a cometer crimes cada vez mais jovens. O bandido que está atrás do menor infrator irá recrutar crianças cada vez mais jovens.
        É claro que não defendo aqui o aprisionamento do menor nas prisões abarrotadas de bandidos adultos, muitos deles sem a menor chance de recuperação. Acho que o menor precisa sofrer uma sanção, mas também deverá ficar protegido numa instituição que lhe assegure educação, lazer e profissionalização.
         Para que o Brasil possa reduzir de fato sua estatística de criminalidade  precisamos exigir boas escolas e bons professores, precisamos exigir atividades extraclasses que possam manter nossas crianças estudando, praticando esportes, brincando, aprendendo a tocar instrumentos musicais e outras atividades lúdicas. Uma escola integral e de boa qualidade poderá manter nossas crianças longe das ruas e da criminalidade.
       Uma escola integral além de proteger nossas crianças irá oportunizar aos pais a tranquilidade de exercer uma profissão sem a preocupação com filhos soltos nas ruas e entregues a própria sorte. Mas uma escola integral e de qualidade precisa passar primeiro pela valorização do professor. Somente a valorização do professor e uma educação de qualidade poderá mudar o curso da nossa história.

Resultado do PET jun/2013

     O resultado do PET é o que eu já esperava: uma das lesões no esterno piorou bastante, mas todas as demais lesões estão estabilizadas ou melhoraram consideravelmente, o que já é uma grande vantagem.
      Tenho duas vértebras comprometidas, mas fiquei aliviada ao ver que a medição metabólica de ambas evidenciaram uma grande melhora. Vértebra com câncer é sempre um problema sério. Das três costelas com câncer, duas estão sem atividade e a terceira teve uma melhora de 30%. As outras lesões, tanto no pulmão quanto no baço, continuam quietinhas. Não sumiram, mas também não pioraram e isto já dá um alívio e tanto. Lesões que apareceram em outros exames nem deram as caras desta vez, e isto só pode ser uma excelente notícia, então posso afirmar sem medo de errar que estou bem e o tratamento está dando muito certo. Na próxima sexta-feira, dia 14, tenho consulta com meu oncologista. Acho que ele vai ficar animado com o resultado dos exames, apesar da piora significativa em um dos tumores do esterno.

Ainda temos um ao outro

            - Dadai, dadai, não vai embora...
            Era assim que Mercedinha se despedia do pai no portão da casa, todos os dias pela manhã, quando ele saía para o trabalho. Enquanto o pai se afastava ela ficava acenando e chorando. Ele olhava para trás, jogava um beijo e seguia seu caminho. Ela adorava aquele pai carinhoso, e ele amava profundamente a única filha. A menina de olhos verdes muito vivos tinha longos cabelos cheios de cachos dourados que emolduravam um rostinho redondo e corado. Ela era linda. Era a paixão daquele pai.
            Na volta do trabalho ela disparava até a porta da casa tão logo ouvia os passos firmes de Heitor ecoando na calçada. O ritual se repetia todos os dias, e assim que a porta se abria ela se jogava no pescoço dele e enchia seu rosto de beijos e os dois entravam abraçados e ficavam brincando juntos por algum tempo até Mercedes se cansar e dormir nos braços do pai.
            A mãe de Mercedes era uma senhora baixinha, de cabelos curtos e castanhos e corpo roliço. Era uma mãe carinhosa e estava grávida do seu segundo filho. Ela vivia para cuidar do marido e da filha pequena.
            Certa ocasião Heitor, o pai de Mercedes, precisou viajar alguns dias a trabalho. Durante sua ausência a cidade onde moravam foi tomada por um surto de doenças contagiosas que dizimou várias pessoas, principalmente crianças. Anita ficou muito aflita quando Mercedes ficou amuada por causa de uma febre constante. Em seguida a menina começou a vomitar e uma diarreia a deixou bastante prostrada. Ela ficou gravemente doente.
            Com o pai ausente e uma gravidez já bastante adiantada Anita precisou internar Mercedes num hospital já superlotado de pacientes com os mesmos sintomas. Ela não saía de perto da cama da menina, mas todos os cuidados foram em vão. Mercedes, assim como vários outros pacientes, também não resistiu ao forte vírus e acabou falecendo poucos dias depois, aos três anos de idade.
            Desesperada de dor e angústia pela perda da filha e sem o marido por perto para lhe dar apoio Anita, de saúde frágil, entrou em trabalho de parto. Sua gravidez, de alto risco, a deixava num estado muito delicado. Os médicos usaram de todos os recursos, mas tudo foi em vão. A criança nasceu morta e Anita ficou entre a vida e a morte na UTI do hospital.
            Heitor, sem sequer imaginar a tragédia que atingira sua família, voltando de viagem entrou correndo em casa chamando pela filha querida que não viera ao seu encontro. Um silêncio sinistro... uma casa vazia. Onde estariam sua mulher e sua filha?
            Uma vizinha, muito a contragosto e sem saber direito como abordar o assunto, veio ao seu encontro e relatou a desgraça que se abatera sobre sua família. Heitor soltou um grito de horror e desespero. Levantando as mãos aos céus ele clamava aos gritos que saíra para trabalhar e voltando para casa encontrara suas duas filhas mortas e sua mulher agonizando no hospital. – O que aconteceu meu Deus? Tenha piedade de mim. Minha família está quase toda destruída. O que eu fiz para merecer tamanho castigo?
            Heitor saiu correndo para o hospital, sua mulher agonizava. Ele segurou suas mãos muito frias e lançou uma súplica a Deus – salve ao menos a minha mulher, já que minhas filhas estão mortas. Tenha piedade de mim.
            As horas foram se arrastando e a noite alcançou Heitor suplicando a Deus, ajoelhado na beira da cama de sua esposa muito amada. Ela resistiu àquela noite e nos dias que se seguiram foi recobrando as forças devagar. Deus ouvira as preces de um homem desesperado.
            Passado alguns dias Anita recebeu alta hospitalar. Ela recuperou a saúde, mas ficou sabendo que não poderia mais ter filhos e suas duas filhas estavam mortas. Anita sentiu-se morrer, mas foi amparada pelo marido que muito a amava. Voltou para casa arrasada, e um silêncio sepulcral, devastador, os recebeu no lar vazio. As gargalhadas de Mercedes silenciaram... estava tudo muito triste e desolador.
        Heitor abraçou Anita carinhosamente e sussurrou em seu ouvido: - ainda temos um ao outro.
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Nascida em berço de ouro

     Hoje resolvi me aventurar a escrever um conto. Vamos conferir o que saiu...

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             O tempo passava e nada da criança ser entregue à mãe que recebera alta. Ela até parecia calma, mas o pai, um senhor já idoso, andava aflito de um lado para o outro na recepção da maternidade e indagava impaciente: - Onde está a criança? Estamos aguardando há mais de uma hora. Ela já deveria ter sido entregue à mãe. Aconteceu alguma coisa? O que vocês estão tentando esconder?
            Uma enfermeira séria, de cabelos grisalhos preso num coque, se aproximou tentando acalmar os ânimos. – Calma meu senhor. Nós vamos encontrar sua menina. Ela está em algum lugar no hospital. Já começamos a entregar todos os bebês para suas mães e não tenho dúvida de que encontraremos a sua.
            O velho pai estava angustiado. Ele já havia perdido duas filhas do primeiro casamento de uma forma trágica e temia que alguma coisa acontecesse com sua filhinha. Sua respiração estava ofegante. Ele não conseguia se acalmar. Onde estaria sua filhinha que acabara de nascer? Ele já estava muito velho e não aguentaria mais uma tragédia.
            As mães internadas estranharam quando receberam seus filhos fora do horário de mamar e indagaram o que estava acontecendo. As enfermeiras explicaram que uma das crianças, cuja mãe recebera alta, estava desaparecida. Elas estavam entregando todas as crianças do berçário às suas respectivas mães na tentativa de encontrar o bebê. As mães, instintivamente, abraçaram seus filhinhos junto ao peito. Não queriam que nada de ruim lhes acontecesse.
            Todos os bebês do berçário das parturientes de baixa renda foram entregues às suas mães e nada da menina. Ela continuava desaparecida. Os funcionários do hospital já começavam a ficar preocupados. Onde estaria a criança? O pai estava a ponto de ter um ataque de nervos na recepção. Ele estava muito nervoso, temendo que algo ruim tivesse acontecido com sua filha recém nascida.
 A chefe da enfermagem ordenou que entregassem todos os bebês das parturientes particulares, quem sabe a criança não estaria entre elas? A criança que sobrasse no berçário, sem dúvida, seria a criança perdida. Assim foi feito, uma por uma cada criança foi entregue a sua mãe.
            Quando todas as mães já estavam com seus bebês no colo um choro sentido se fez ouvir. Era a criança perdida. Durante o banho sua pulseirinha de identificação caiu e ela havia sido colocada, por engano, junto aos bebês das parturientes particulares. Uma enfermeira correu para pegar a menina e saiu rápido para entregá-la ao pai que aguardava ansioso na recepção da maternidade. Sorrindo ela lhe disse: Aqui esta sua filhinha. Pode relaxar agora, não aconteceu nada demais. É que sua filhinha já nasceu em berço de ouro! Estava dormindo tranquilamente no berçário das crianças ricas.        
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Uma anciã muito ativa

           Seus cabelos já estão brancos há muito tempo, mas seu corpo magro e pequeno continua ágil. Nem parece uma anciã de 86 anos. Levanta cedo e vai direto para o quintal, varre a grama, recolhe o lixo e em seguida vai cuidar dos passarinhos de estimação que ficam na gaiola.
Limpa a gaiola e troca a água e a comida do Neto, um melro metálico. Ele é um pássaro azul escuro brilhante de olhos muito amarelos. É lindo! E ninguém diz que já está com mais de dez anos. O Neto adora comer frutas, e suas prediletas são maça, mamão, laranja, mas ele também não dispensa uma suculenta e gorda minhoca. Ele é fascinado por insetos e sempre que vejo algum dando bobeira em casa eu levo o bichinho até a gaiola. É uma verdadeira festa. Outra iguaria que ele adora é um ovo cozido.
Se a parte da manhã é dedicada as plantas e aos bichos, sejam eles de estimação ou aqueles soltos na natureza, a tarde costuma ser dedicada a costura enquanto ela assiste algum programa na televisão. Ontem ele fez roupas novas para algumas bonecas que retiramos das caixas onde estavam guardadas, para colocá-las expostas nos armários com portas de vidro. Ela lavou e penteou os cabelos das bonecas e também do cavalo branco da Barbie. Está tudo limpinho e organizado nas vitrines. Acho que estamos na estação nostalgia... Deve ser porque a Bárbara foi morar na própria casa.
 Hoje pela manhã minha mãe entrou na lavanderia carregando uma vasilha de comida de passarinho com um agaporne morto dentro. Era um dos seus passarinhos que estimação que estava doentinho. Ele ficava tremendo o tempo todo e dizíamos que o bichinho devia sofrer de Alzheimer. Peguei uma sacola plástica para colocar o passarinho no lixo, mas ela disse que preferia enterrar no canteiro dos bichos de estimação da casa, e lá se foi ela carregando o passarinho para enterrar.
Passado algum tempo, depois que todos saíram de casa, ela foi para a cozinha tomar o café da manhã. Sempre que estamos sozinhas ela costuma relembrar seu passado, no tempo em que ela era criança e morava na roça e hoje não foi diferente. Seus olhos ficam distantes e ela então começa a falar. Hoje ela se lembrou dos campos branquinhos, cobertos pela geada que caía durante a madrugada e se perguntou: - porque naquele tempo eu pisava no gelo e andava léguas sem me incomodar com o frio e hoje sinto frio o tempo todo? Sorri para ela e disse-lhe que criança não costuma sentir muito frio e naquele tempo ela não devia ter muita opção. Depois ela se lembrou de sua irmã Suzana e das artes e brincadeiras que as duas faziam juntas. Elas colhiam frutos silvestres no mato, pescavam e corriam soltas pelos campos das grandes fazendas no interior de São Paulo.
Minha mãe adora mexer na terra até hoje. Ela gosta de plantar e colher. Seu maior prazer é ver a flor se transformar em fruto ou legume e colher para a família ou algum amigo comer. Hoje foi dia de colher tangerina. Ela trouxe um balde cheio para a cozinha e fez uma enorme jarra de suco que eu saboreei em seguida. Estava uma verdadeira delícia.

Esperando o resultado do PET

     Ainda bem que o médico me liberou do exame ao meio-dia na segunda-feira, pois a máquina só conseguiu ser consertada após as 16h. Era impossível ter aguardado tanto, mas ontem eu consegui  fazer o PET. Para variar, foi uma verdadeira novela mexicana a tentativa para puncionar minha veia. A primeira enfermeira tentou, tentou, mas não conseguiu. Chamou uma colega que também tentou e foi outro fiasco, então eu vi uma enfermeira que já havia conseguido puncionar minha veia em outro procedimento e a chamei. Ela veio toda sorridente e prestativa e comentou que realmente minha veia é um pouco difícil e muito profunda, mas bastou uma picada e o sangue jorrou vermelho na agulha. Ufa! Que alívio. Agora é só aguardar o resultado do exame que ficará pronto no sábado pela manhã.
     Hoje pela manhã matei minha vontade de comer meu pãozinho quente com café com leite. Cardápio tão bobo né, mas quando não como esta dupla pela manhã parece até que não tomei meu café da manhã. Aproveitei para comer também um pedaço de cuca que a Suzi preparou ontem. Hummm, estava uma delícia! No almoço comi arroz e achei ótimo. Como é bom poder comer um pouquinho de tudo, sem restrições. Não como muito, mas acho muito chato não poder comer isto ou aquilo.
     Das duas últimas vezes que fiz o PET pude notar que agora o exame é bem mais tranquilo e não é preciso ficar tempo demais na máquina. Das primeiras vezes que fiz este exame era um verdadeiro tormento, pois a posição na máquina era muito incômoda e demorava muito tempo. Meus braços e minhas costas doíam horrores. Agora eles colocam um apoio embaixo do joelho que ajuda a manter a coluna alinhada e sem dor e o tempo na máquina parece que reduziu bastante, pois não chego a sentir o braço doer embora ele fique esticado atrás da cabeça.
     Nada como a evolução da teconologia. A cada dia que passa as coisas vão melhorando e com isto melhora também a qualidade de vida dos pacientes. Ainda não perdi as esperanças de que a cura do câncer poderá acontecer em breve. A evolução no tratamento, desde que tive o câncer primário em 1998, é visível. Muitos remédios novos vieram para revolucionar o tratamento. Já estou sobrevevendo a várias metástases há mais de 7 anos e sou prova viva de que muito coisa melhorou. Aliás, a bem da verdade, não tenho a menor pretensão de morrer do câncer. Isto nem me passa pela cabeça.
     
    

Gastronomia do IESB - prova final - Degust 2013

     Eu já estava tremendo e mal conseguia coordenar meus pensamentos após mais de quinze horas em jejum para fazer o PET. A máquina havia parado de funcionar e já passava do meio dia quando fui questionar se ela seria consertada ou não para eu fazer o exame porque estava difícil permanecer em jejum mais tempo. Na dúvida, o médico acabou mandando remarcar o exame para hoje e me liberou.
     Eu me sentia tão enfraquecida que optei por pedir uma omelete na lanchonete da clínica porque era o único prato que eu poderia comer para manter a dieta sem carboidratos e açúcares. Já comi tanta omelete nestes últimos três dias que pretendo passar longe desta iguaria por um bom tempo.
    A Helena foi buscar-me na clínica e eu passei o restante da tarde na casa dela. A noite estava programado irmos participar do degust do grupo da Suzi, que está formando em gastronomia pelo IESB de Brasília. O cardápio prometia ser um sucesso, mas com minha dieta eu sabia que não poderia experimentar nada. Quase desisti, mas acabei indo pretigiar minha irmã e seus colegas.
     Chegamos no restaurante Atelie do Chef pontualmente às 20h, mas as portas ainda estavam fechadas. Vários convidados aguardavam para entrar e assim que abriram as portas fomos os primeiros a ocupar uma longa mesa com dez lugares.  Eram sessenta convidados no total e todos pareciam ansiosos para degustar as delícias estampadas no cardápio. A entrada era um trio de massas, em seguida einsbein com chucrute, picanha com purê de abóbora e crocante de polenta trufada e, para sobremesas, um trio sensacional.
     O trio de massas foi um verdadeiro sucesso mas não posso dar minha nota, pois só olhei e passei o prato para frente. Experimentei o einsbein e aprovei. Estava uma delícia, mas o restante do cardápio não pude experimentar. Todos os convidados da Suzi comentavam que tudo estava uma delícia. Que pena eu não poder comer nada daquilo. Fiquei só bebendo água.
     No final do jantar a Suzi subiu para cumprimentar seus dez convidados e distribuiu para cada um deles um ima com o desenho de um chapéu de chef e seu nome gravado, ela também serviu um "bem formado" que o Marco experimentou e aprovou na hora. Ele gostou tanto do doce que já fez até uma encomenda. Todos os convidados abraçaram a mais nova chef do pedaço e desejaram sucesso na profissão.
     A Suzi estava muito feliz, apesar de exausta. Ela e seus colegas de grupo trabalharam arduamente para o sucesso do degust. Foram muitos dias e muitas horas experimentando e criando receitas até definirem o cardápio. Valeu o esforço, pois estava tudo lindo e delicioso.