Uma anciã muito ativa

           Seus cabelos já estão brancos há muito tempo, mas seu corpo magro e pequeno continua ágil. Nem parece uma anciã de 86 anos. Levanta cedo e vai direto para o quintal, varre a grama, recolhe o lixo e em seguida vai cuidar dos passarinhos de estimação que ficam na gaiola.
Limpa a gaiola e troca a água e a comida do Neto, um melro metálico. Ele é um pássaro azul escuro brilhante de olhos muito amarelos. É lindo! E ninguém diz que já está com mais de dez anos. O Neto adora comer frutas, e suas prediletas são maça, mamão, laranja, mas ele também não dispensa uma suculenta e gorda minhoca. Ele é fascinado por insetos e sempre que vejo algum dando bobeira em casa eu levo o bichinho até a gaiola. É uma verdadeira festa. Outra iguaria que ele adora é um ovo cozido.
Se a parte da manhã é dedicada as plantas e aos bichos, sejam eles de estimação ou aqueles soltos na natureza, a tarde costuma ser dedicada a costura enquanto ela assiste algum programa na televisão. Ontem ele fez roupas novas para algumas bonecas que retiramos das caixas onde estavam guardadas, para colocá-las expostas nos armários com portas de vidro. Ela lavou e penteou os cabelos das bonecas e também do cavalo branco da Barbie. Está tudo limpinho e organizado nas vitrines. Acho que estamos na estação nostalgia... Deve ser porque a Bárbara foi morar na própria casa.
 Hoje pela manhã minha mãe entrou na lavanderia carregando uma vasilha de comida de passarinho com um agaporne morto dentro. Era um dos seus passarinhos que estimação que estava doentinho. Ele ficava tremendo o tempo todo e dizíamos que o bichinho devia sofrer de Alzheimer. Peguei uma sacola plástica para colocar o passarinho no lixo, mas ela disse que preferia enterrar no canteiro dos bichos de estimação da casa, e lá se foi ela carregando o passarinho para enterrar.
Passado algum tempo, depois que todos saíram de casa, ela foi para a cozinha tomar o café da manhã. Sempre que estamos sozinhas ela costuma relembrar seu passado, no tempo em que ela era criança e morava na roça e hoje não foi diferente. Seus olhos ficam distantes e ela então começa a falar. Hoje ela se lembrou dos campos branquinhos, cobertos pela geada que caía durante a madrugada e se perguntou: - porque naquele tempo eu pisava no gelo e andava léguas sem me incomodar com o frio e hoje sinto frio o tempo todo? Sorri para ela e disse-lhe que criança não costuma sentir muito frio e naquele tempo ela não devia ter muita opção. Depois ela se lembrou de sua irmã Suzana e das artes e brincadeiras que as duas faziam juntas. Elas colhiam frutos silvestres no mato, pescavam e corriam soltas pelos campos das grandes fazendas no interior de São Paulo.
Minha mãe adora mexer na terra até hoje. Ela gosta de plantar e colher. Seu maior prazer é ver a flor se transformar em fruto ou legume e colher para a família ou algum amigo comer. Hoje foi dia de colher tangerina. Ela trouxe um balde cheio para a cozinha e fez uma enorme jarra de suco que eu saboreei em seguida. Estava uma verdadeira delícia.
1 Response
  1. Anônimo Says:

    Li o texto comendo uma dessas tangerinas. Delícia!!!! A vovó é um espetáculo!


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Obrigada pelo comentário. bjs Lou