Ontem saí cedo, era dia de fazer quimioterapia e eu ainda precisava passar antes na Clínica Villas Boas para pegar o resultado do PET. Assim que o rapaz entregou meus exames peguei o laudo para ler a conclusão afinal, depois de tantos anos em tratamento e depois de tantos laudos e exames, já consigo avaliar se a doença melhorou ou não. Para meu alívio o resultado dos exames mostrou que o protocolo adotado pelo dr. Fernando Maluf está dando resultado e eu estou muito melhor. Ufa!

      Ainda bem que insisti com o dr. Fernando e ele concordou que seria melhor fazer o PET depois que eu retornasse da minha viagem de férias. Viajar para mim é muito terapêutico. Eu adoro conhecer lugares novos, andar sem pressa, sem rumo, sem hora de chegar... Ter ficado numa cidade pequena e de natureza exuberante foi a melhor coisa que fiz por mim. Eu tinha o mar, as escarpas, os belos jardins, as florestas, toda a mítica Bretanha para reabastecer meu corpo da energia vital que eu queria e precisava. A energia que emana da natureza.

     Será que a magia de Merlin funcionou quando conheci a Floresta de Broceliande e provei a água da fonte da juventude? Quem sabe? Dizem que a água da fonte tem o poder mágico de curar doenças crônicas e não custa nada acreditar... Eu não fiquei mais jovem, isto é fato e o meu espelho não deixa dúvidas, mas quem me garante que por dentro algo mágico não aconteceu... O resultado dos exames é claro: a doença regrediu, como por encanto... como por magia...

     Na Bretanha tudo o que fiz foi estar em contato direto com a natureza. Abracei um carvalho milenar, andei por caminhos sinuosos e úmidos no meio da floresta densa, ainda envolta na neblina que deixava tudo meio opaco e fantasmagórico... Os raios do tímido sol do outono bretão mal conseguiam alcançar o chão coberto de folhas secas caídas das árvores que se preparavam para o inverno que anunciava sua chegada para breve... O silêncio da mata, quebrado às vezes pelo grasnar agourento dos corvos, dava a impressão de que a qualquer instante uma figura fantástica dos mitos da Bretanha iria saltar na minha frente tentando me assustar... eu caminhava devagar e atenta aos ruídos da mata. Não vi nenhum monstro ou qualquer divindade, mas vi de perto uma natureza quase intocada, bela, verde, cheia de flores silvestres, cheia de vida... Eu estava caminhando na Bretanha profunda, no Argoat, na floresta.

     Caminhei muito pelas promenades do Canal da Mancha e do estuário do Rio Rance. Caminhos estreitos e sinuosos espremidos entre o mar e as escarpas que abrigam charmosas vilas da belle époque com suas casas feitas de pedras. Dinard é uma bela cidade balneária que  ainda exibe o esplendor dos tempos em que era considerada a chique Riviera Francesa, lá pelos anos 20. Ela ainda continua sendo um procurado destino de férias dos ingleses que deixaram sua marca na cidade.

     Eu gostava de caminhar ao cair da tarde, vendo o sol se esconder enquanto tingia o céu e o mar de cores vibrantes e dava lugar a lua que prateava as águas do Canal da Mancha enquanto a maré subia, ora calma, ora nervosa, impetuosa... explodindo suas ondas nas largas calçadas que margeiam a praia. Eu gostava de ver o mar subir e cobrir a piscina construída na praia até baixar de novo deixando aprisionados cardumes inteiros de peixinhos pequenos. Eu gostava de caminhar pela promenade vendo crianças pescando com suas pequenas redes alguns camarões incautos, aprisionados nas poças que se formavam nas pedras que a maré baixa deixava expostas na manhã seguinte.

     O balé das águas do Canal da Mancha me encantavam e conseguia encher meu corpo de endorfinas. Eu estava feliz em Dinard. Eu estava muito feliz na Bretanha.