Cirurgião cardíaco sem diploma
quarta-feira, janeiro 26, 2011
Poucas pessoas ouviram falar do excepcional cirurgião e professor sul-africano Hamilton Naki, negro na África do Sul do apartheid.
Naki parou de estudar aos 14 anos, saiu da aldeia onde morava e foi para a capital onde conseguiu trabalho no Laboratório da Faculdade de Medicina da cidade do Cabo.
Naki parou de estudar aos 14 anos, saiu da aldeia onde morava e foi para a capital onde conseguiu trabalho no Laboratório da Faculdade de Medicina da cidade do Cabo.
Inicialmente cuidava dos animais cobaia do laboratório onde os futuros médicos treinavam as técnicas de transplante em cães e porcos. Como era curioso e aprendia tudo muito depressa acabou aprendendo cirurgia apenas assistindo experiências com animais e assim foi aproveitado como ajudante na clínica cirúrgica da escola.
Naki foi aprendendo procedimentos cirúrgicos cada vez mais complexos com maestria, apesar de não ter estudado formalmente. Sua técnica e capacidade acabaram reconhecidas e ele teve permissão especial para continuar suas pesquisas no laboratório, com animais, incluindo transplantes e se tornou um dos técnicos do laboratório de pesquisa da Faculdade de Medicina. Dava assistência aos jovens cirurgiões em atividades com animais no laboratório, incluindo pesquisas em transplantes de rins, coração e fígado.
Tornou-se um cirurgião excepcional, a tal ponto que Christiaan Barnard o requisitou para sua equipe. Para que isto acontecesse foi quebrada uma das leis sul-africanas, pois na África do apartheid um negro não podia operar pacientes e muito menos tocar no sangue dos brancos. Mas o hospital abriu uma exceção para Naki que acabou se tornando um cirurgião requisitado, mas clandestino.
Era o melhor no que fazia. Dava aula aos estudantes brancos, mas ganhava salário de técnico de laboratório, o máximo que era permitido por lei para um negro. Vivia num barraco sem luz elétrica ou água corrente, num gueto da periferia.
Na primeira operação de transplante cardíaco humano bem sucedida, que aconteceu na cidade do Cabo, na África do Sul, foi Naki quem retirou do corpo da doadora o coração transplantado para o peito de Louis Washkanki em dezembro de 1967, mas como ele não podia aparecer, por ser negro no país do apartheid, quem tornou-se celebridade instantânea foi o doutor Christiaan Barnard.
Naki foi, sem dúvida, o homem mais importante da equipe do dr. Barnaard, mas não pode sequer sair nas fotografias da equipe e quando, por descuido de um fotógrafo desavisado, apareceu numa, o hospital informou que se tratava do faxineiro do prédio.
Hamilton Naki ensinou cirurgia durante 40 anos, mas aposentou-se em 1991 com uma pensão de jardineiro, de 275 dólares por mês. Mesmo aposentado continuou trabalhando como cirurgião, sua paixão, em um ônibus adaptado como clínica móvel. Foi um dos melhores cirurgiões da história do mundo, nunca desistiu, mesmo sendo discriminado.
Com o fim do apartheid tornou-se famoso mundialmente. Numa entrevista confirmou sua participação no primeiro transplante de coração, mas não há qualquer referência ou registro oficial do fato, ou pelo menos algum registro no hospital sobre sua colaboração no feito.
Ganhou uma condecoração e um diploma de médico "honoris causa", honraria mais do que justa e merecida. Nunca reclamou das injustiças que sofreu a vida toda, ao contrário, agradecia sempre por ter podido ajudar a salvar a vida de tantas pessoas.
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Obrigada pelo comentário. bjs Lou